Bailando em Salento

Foto de Todd Breese

            Conheci Todd em La Paz, Bolívia, em Novembro de 2014. Divertimo-nos muito durante os dias que aí passei, compartilhando experiências, momentos, juntamente com Ron – um americano com quem partilhávamos o dormitório no hostal Pirwa.
            A descida da Estrada da Morte, de bicicleta, foi o acontecimento que nos aproximou. Os dois, eu e Todd, sempre em busca de novas e excitantes experiências – acrescente-se, a busca de encontros com pessoas estimulantes. Era o caso de Todd – a pessoa que me provocou com as suas fotografias de Salar de Tara, impelindo-me a viajar até ao Deserto de Atacama, não desde Arica, como inicialmente pensara, mas indo directamente para San Pedro de Atacama.
            Viajámos juntos para Uyuni onde, depois de passear pela vila onde o Rally Dakar levanta poeira, nos despedimos num forte abraço, sussurrando: até breve. Todd seguiu para o Salar de Uyuni – um dos locais que ainda tenho a expectativa de ir; haja oportunidade e, com toda a certeza, a agarrarei de peito e braços abertos, não fossem os testemunhos que fui escutando tão peremptórios quanto à beleza e paz desse lugar. Apanhei o autocarro para o Chile com a sensação de estar a viver mais um sonho a cumprir-se... e com a vaga impressão que me encontraria novamente com Todd, algures na vastidão do mundo.
            Pouco mais de seis meses depois, o pressentimento tornou-se realidade. Durante os meses em que pairei no Porto e arredores, íamos trocando correspondência no mundo virtual. Em Maio seguinte aterrei na Colômbia – o país onde Todd se encontrava!, dando continuidade ao seu périplo pela América Latina. Este continente provoca, seguramente, uma atracção indizível aos ‘estrangeiros’. 
         Depois de várias semanas em locais distintos, o encontro realizou-se em Salento – na zona cafeeira da Colômbia. Uma escolha criteriosa. Ambos sabíamos que era um dos lugares mais bonitos desse país quente, sendo manifestamente obrigatório, na nossa perspectiva, uma visita a uma Finca de Café, se possível em boa companhia. 
         Parti de autocarro desde Bucaramanga, a cidade mais limpa da Colômbia, dizem, na qual tive o privilégio de conhecer uma mulher extraordinária, uma americana que viajava há dois meses de bicicleta. Ao fim de catorze horas, o abraço desejado numa guesthouse de Salento.
            Foi um fim-de-semana memorável. Salento proporcionava um cenário extraordinário com os seus muitos verdes como pano de fundo, no Valle de Cocora. Uma caminhada de várias horas conduziu-nos a um santuário de aves exóticas, onde os colibris de todas as cores, com os seus matizes de azul me ofuscavam o olhar. Tão pequeninos e esvoaçantes, os colibris coloriam as árvores verdejantes de copas frondosas, fazendo-as rumorejar de felicidade. As flores de todas as cores, muito vívidas, por que íamos passando: mais um elemento irresistível. Escutava algo que me exortava a tocar nas suas pétalas macias, cuja voluptuosidade inebriava o mais desatento dos mortais. 
Foto de Todd Breese

            Esse passeio culminou num prado habitado de palmeiras tão altas que me faziam acreditar que as suas folhas roçavam as nuvens. Corremos, como crianças, atrás do nada. Corremos infantilmente, brincando nas tonalidades palpáveis e divinas que os olhos captavam, envolvendo todos os sentidos. O vale escorria por entre os dedos e seguíamos extasiados pelo silêncio humano. Despertámos, enfim, do idílio da natureza perfeita, retomando os caminhos para a vila, onde as ‘calles’ povoadas de casas térreas alegremente pintadas nos reavivaram os sentidos. Estávamos vivos e gratos. A comemoração era imprescindível.
A noite caiu e as ruas encheram-se de gente. Sábado à noite convidava à festa e nós facilmente sucumbimos à espontânea boa-disposição das gentes colombianas. A ‘aguardiente antiqueño’  encorajou outros mecanismos internos. ‘Bailando’, do Iglesias mais novo, foi a banda sonora perfeita para dançar alegre e ebriamente na praça.
Foto de Todd Breese
            O fim-de-semana terminou com uma visita a uma das Fincas de Café. Guiados pelo aroma de um dos melhores cafés do mundo, experienciámos o ciclo de produção dessoutro estimulante dos sentidos, fotografando e rindo com os sabores dos grãos ainda amargos.
Doce é a memória do australiano a viver a sua vida encantada. É provável que, mais cedo que mais tarde, a vida nos propicie um novo encontro, para assim termos ocasião de partilhar o que entretanto aprendemos desde então. Confio que sim. Muito obrigada Todd!



Maio, 2016
Matosinhos, Portugal

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