Página em branco…*









Cada vez que os três dedos – polegar, indicador e médio – seguram a esferográfica e a pressionam sobre o caderno – neste caso, uma sebenta igual àquelas que usava quando andava na escola primária; adquiri algumas na feira da Vandoma e só por isso vale a pena regressar; o que não está longe de acontecer. Cada vez que os dedos seguram a esferográfica e a pressionam sobre a sebenta, dizia, aguardo com confiança que as palavras surjam. Palavras que se encadeiam, umas a seguir às outras, com o intuito de expressar uma ideia, um sentimento, uma opinião, ou tão-somente, como acontece neste instante, para mostrar que estou receptiva a uma Qualquer Inspiração. Inspiro profundamente, calo os pensamentos, como numa atitude meditativa, e permito que a esferográfica flua.
Até ao momento ainda não terei alcançado ou escutado algo que valha a pena partilhar.
Há uns tempos, tomei a decisão de desenvolver estas crónicas, e grande parte do que vou escrevendo para partilhar, com o objectivo de provocar no leitor e na leitora pelo menos o esboço de um sorriso. Nem sempre é fácil, dado que os temas que cada mês me oferece nem sempre são passíveis de gerar textos que a tal conduzam. Pretensão minha, poderá aventar-se. Todavia, essa resolução tem um motivo.
Partilhar as minhas opiniões sobre assuntos da actualidade não é, a meu ver, um bom propósito para o espaço que aqui me é concedido. É natural que as minhas apreciações sejam distintas de quem as lê. Podem até ser tão pessimistas em determinadas ocasiões, que a sua publicação seria apenas mais um momento infeliz. Quero com isto dizer que, tal como na minha vida, também aqui prefiro compartilhar o que, pelo menos na minha perspectiva, conduza a uma reflexão – mesmo que superficial – de um modo positivo – coloquemos assim.
A vida quotidiana é tão cheia de estímulos negativos – mais uma vez coloquemos assim –, que ler um texto que surta o mesmo efeito não é, de todo, a minha vontade.
É provável que nessa empresa nem sempre alcance o sorriso na leitora ou no leitor. Porém, posso afirmar que quase sempre é com esse intuito que a sebenta se abre, os dedos seguram na esferográfica e a pressionam em direcção à página em branco.
Com todo este paleio, é quase certo que o único efeito que terei provocado até ao momento tenha sido um bocejo. Ora, isso pode até ser interessante. Repare o leitor ou leitora: em noites de insónia, pode sempre pegar no jornal e abri-lo na página onde aparece uma fotografia da minha pessoa e pensar: aqui está alguém que me pode ajudar a dormir. Et voilá!
Este mês corro, pois, o risco de me ser aplicada a expressão: fala fala fala, mas não diz nada.
Bom, até pode ter a sua razão, a leitora ou o leitor. De qualquer modo, pode eventualmente aproveitar a oportunidade para desenvolver um pouco mais a empatia e a tolerância. Qualidades, a meu ver, primordiais para que olhemos as pessoas que nos rodeiam de forma compassiva. Aceitar, mesmo que não se compreenda o porquê, os comportamentos e as atitudes dos outros sem tecer qualquer crítica ou julgamento. Afinal, que sei eu por que experiências esta ou aquela pessoa terá passado. Pois é... quantas vezes terei eu mordido a minha língua viperina escassos segundos após um comentário mordaz. Só porque alguém terá dito algo que me terá soado desagradável. Contudo, tenho aprendido que quase nada é pessoal, que quase nada é dirigido a mim. Com muita frequência, as palavras menos simpáticas que escuto decorrem de incidentes ou acidentes prévios à interacção em que estou envolvida. Por esse motivo, tem sido cada vez mais comum que, antes de reagir, olhe para a pessoa à minha frente e me lembre que também ela é um ser humano, como eu, cuja história de vida eu não tenho a mais pequena ideia e que por isso sou totalmente ignorante em relação ao seu modo de estar. Um modo de estar que não é necessariamente – e é até improvável – o seu modo de ser.
Como no dia 25 de Abril se comemora o dia da Liberdade em Portugal, acabo de ter o meu momento de livre expressão, confiando que a leitora ou o leitor também aproveite a não garantida liberdade de ser quem é. Obrigada pela compreensão...


* Este texto foi publicado no Jornal o Chapinheiro

Voando para Manágua*



           Ainda não eram seis da manhã na Cidade do México quando me acerquei de um dos balcões do aeroporto, a fim de efectuar o check-in para Manágua. Saí cedo de casa de Patrícia e Arturo; pressenti que seria de evitar chegar em cima da hora. E, com efeito, não foi fácil despachar a mochila para a capital da Nicarágua.
            O principal motivo para conhecer Nicarágua prendia-se com a realização de um retiro de meditação. Todavia, os planos foram ‘desplaneados’ e desisti de me sentar mais dez dias em silêncio em Granada (seria o segundo retiro nesta viagem). Uma decisão já tomada e que não se deveu ao pequeno percalço no aeroporto da capital do México.
            A esse aeroporto, como a quase todos os que chego para partir, o tempo de antecedência com que me dirigi ao balcão permitiu-me resolver o que para mim era inesperado: não tinha visto para estar algumas horas num aeroporto dos Estados Unidos, em escala! Comprara o voo através do skyscanner. Na maioria das vezes adquiro o mais económico, nem que isso implique conhecer todos os cantos e cadeiras desconfortáveis dos aeroportos. Como acusa Luís Sepúlveda, são duros assentos desenhados por criminosos da modernidade.
            Desta vez, porém, o barato saiu caro – antes do check-in tive de ir a um estabelecimento comercial do aeroporto para aceder à internet sem fios. O meu dispositivo electrónico não aceitou qualquer cartão desde que aterrei no outro lado do mundo, alguns meses antes. Por conseguinte, para aceder ao mundo virtual neste aeroporto rendi-me a mais um Starbucks e bebi um café para adquirir a contra-senha.
            Felizmente, a hospedeira de terra mexicana – como todas as mexicanas que conheci – foi muito simpática e prestável; indicou-me todos os passos para obter um visto e assim aterrar tranquila no aeroporto de Hollywood – Fort Lauderdale. Dezasseis dólares, o visto, mais dois ou três pelo café americano. As despesas não se ficaram por aqui. Se em grande parte das vezes é estimulante viajar sem planos, outras vezes, a ausência de pesquisas prévias pode ter resultados menos agradáveis.
Talvez por sentir algum cuidado, quando toquei o solo dos Estados Unidos – a primeira e única vez até ao momento – dirigi-me de imediato ao balcão do check-in. E de facto...
Felizmente, a hospedeira de terra do aeroporto de Hollywood também era simpática e prestável. A sua empatia por mim desenvolveu-se quando lhe dei a saber que estivera na sua terra natal – aproveitei o sotaque da senhora para alimentar a conversa – no ano anterior. Acrescentei que gostei tanto dos lugares e das gentes do Peru que desejava regressar. Era a pura verdade. O Peru encheu-me, sem me satisfazer por completo: quero regressar!
Pois bem, a sua simpatia latina ajudou-me a ultrapassar mais uma situação: para entrar na Nicarágua era necessário ter um bilhete de saída. Como? É verdade. Assim como foi verdade para entrar posteriormente na Costa Rica, no Panamá e no Brasil. O regresso ao Porto também foi condicionado pela necessidade de ter data marcada para deixar o Rio de Janeiro.
Mas – há quase sempre muitos mas – e neste caso um porém muito prático: não fazia ideia do tempo que iria permanecer na Nicarágua, nem tão-pouco tinha a certeza do destino seguinte. O meu único plano era estar no Rio de Janeiro a nove de Outubro, mas ainda estava no início de Setembro.
Comprar uma passagem para o Rio desde Manágua estava fora de questão. Não só sabia que era um valor muito elevado, como implicaria estar as seis semanas seguintes circunscrita à Nicarágua. A sugestão da hospedeira: comprar um bilhete de regresso para Fort Lauderdale. Como?? Esse parecia-me um cenário ainda pior.
            A senhora insistia na sua sugestão. Escutei: “Tem vinte e quatro horas para anular a compra” – hum... – “Ser-lhe-á devolvido o total do montante” – hum... “Ok!” Ser detentora de um cartão de crédito é das melhores coisas quando se viaja, pelo menos para mim. Resolve situações antes que se transformem em problemas. E assim foi.
            Estava nos Estados Unidos da América, num aeroporto em Hollywood, pagara dezasseis dólares e estava nesse momento a pagar para regressar sem ainda daí ter saído.
            As horas no aeroporto norte-americano foram bem passadas. Nessa época trabalhava na revisão de uma dissertação de mestrado – o iPad é outro objecto que se tem revelado muitíssimo prático e útil para viajar. É um dois, três, quatro, cinco em um. Leio, escrevo, trabalho, organizo (nem sempre bem) as viagens e ainda comunico com os amigos e família. Tenho tido acesso à internet sem fios em quase todos os lugares por onde vou passando. Assim sendo, aproveitei o tempo para trabalhar.
Aproveitei, igualmente, para observar as pessoas norte-americanas ao vivo e no seu habitat natural. Pode ‘soar’ estranho, mas para mim era ainda mais estranho estar nos Estados Unidos sem estar. Repito-me no recurso a Marc Augé, quando se refere aos aeroportos como não-lugares. Era assim que me sentia, num intervalo vazio – para usar a expressão de Italo Calvino, em ‘Um Eremita em Paris’. Um parêntesis num território que, apesar disso, tinha de se pagar.
Devo ter alguma coisa a aprender com os aeroportos, tanto é o tempo que aí vagueio, como foi no de Manágua. Esta viagem foi daquelas que se revelou um caso oneroso em tempo e dinheiro.
Na madrugada seguinte conhecia a textura e o desconforto dos assentos do aeroporto de Manágua. Aterrei à uma da manhã, mas era necessário esperar pacientemente pela manhã seguinte e assim ir ao escritório da companhia aérea a fim de reaver o valor virtualmente gasto. Outras horas largas aproveitadas a descansar (o possível) e a adiantar a revisão da tese, assim como a observar os Nicas – como carinhosamente escutei a estrangeiros de outros países da América Central.
Às dez da manhã, o cartão visa era ressarcido na totalidade pela despesa em solo americano. Saía, enfim, do aeroporto a pé para apanhar mais um chicken bus, desta vez rumo a Granada.
           


Fevereiro de 2016
Matosinhos, Portugal

*Sempre que penso na Nicarágua escuto interiormente a música de Manu Chao, Me gustas tu. Fica aqui a partilha; basta clicar na legenda da fotografia que é do vulcão da ilha de Ometepe

'Drinking games'




            John, um jovem americano, advogado, de férias no Belize. Trabalhava num escritório de produção cinematográfica em Hollywood. Estava sempre a coçar o corpo e falava num tom marcadamente nervoso.
Conheci John em Caye Caulker, uma das ilhas belizianas, para a qual muitos se deslocam por causa do Blue Hole – uma das grandes maravilhas do planeta. Neste caso, no maior recife de coral do hemisfério norte. Exemplo disso era Andy, um alemão que aproveitou as suas férias de Verão para realizar um curso de mergulho na ilha, no final do qual teve o privilégio de mergulhar no grande Buraco Azul.

            Mark, holandês, com pouco mais de trinta anos e já um grande sucesso de empreendedorismo nos Países Baixos. Também estava de férias nessa ilha do Caribe. Sempre bem-disposto, rindo e sendo agradável com todas as pessoas, sobretudo com as mulheres com quem se cruzava. Numa das ‘hamacas’, lia um livro do género de crescimento pessoal. Aprendia, afirmava o rapaz charmoso, que só estando bem na sua pele alcançaria a felicidade. O seu sorriso vagueava entre o fácil e o muito fácil, iluminando um rosto de feições bonitas (para o meu gosto), com olhos verdes claros. De cabelos loiros e ondulados e do alto dos seus cento e noventa centímetros, facilmente me encantou.
            Além de Mark, Andy e John, outros e outras se juntavam ao fim da tarde na mesa exterior do Bella’s Backpackers hostal, onde trabalhei duas horas por dia em troca da dormida. Foi na minha segunda noite na ilha que começaram os ‘drinking games’, por iniciativa de Glenn: um australiano, antigo jogador de rugby, mas que, por força de uma lesão, se viu obrigado a abandonar uma carreira desportiva promissora. Glenn era viajante. Terminaria daí a uma semana a sua longa viagem – seis anos! Terá, com toda a certeza, um baú repleto de memórias, fotografias e muitas histórias para partilhar. Estou certa que a herança que lhe permitiu essa vivência não ficará por contar. Pelo menos foi essa a ideia que passou àqueles que com ele aprenderam inúmeros jogos, durante os fins de tarde cálidos em Caye Caulker.
            Quantas garrafas de rum e cola se esvaziaram é difícil contabilizar. Através da desinibição, provocada pela ingestão do seu conteúdo incalculável, muitas histórias se partilharam, nomeadamente a de John. Percebemos então porque se coçava tanto. Um jovem que ilustrava um dos paradoxos contemporâneos da competição em Harvard.
            Apesar de ser advogado há pelo menos três anos, John ainda necessitava, e provavelmente ainda mais, de continuar a tomar uma série de substâncias químicas. Estupefacientes para estudar – a cocaína era um dos seus preferidos – de forma continuada e concentrada. Estupefacientes para descansar após a época de exames. Estupefacientes para se manter desperto ao longo do dia. Estupefacientes para se divertir q.b. Estupefacientes para relaxar quando necessário. Os últimos não deviam surtir grande efeito, já que as suas mãos não paravam – coçavam as pernas, os braços ou levavam os copos de rum com cola à boca. Estupefacta estava eu enquanto escutava o quotidiano de um jovem universitário americano, cujo colapso nervoso me parecia inevitável, num futuro não muito longínquo.
            Contrariamente, Andy, um alemão com quem corri na ilha, era um jovem muito tranquilo. Irradiava serenidade no seu sorriso silencioso e terno. Falava apenas quando lhe dirigiam a palavra e o resultado era uma piada espirituosa que nos fazia rir. Note-se que o rum ajudava a elevar a intensidade das risadas.
A risota aumentava à medida que as horas avançavam e com as confidências que entretanto se iam efectuando em jogos do tipo ‘verdade ou consequência’. Glenn era um animador profissional e Mark soltava o seu charme para as jovens que se iam juntando à mesa antes de irem dançar num dos bares da praia.
John, porém, não tinha forças para essas andanças. Ao início da noite, o seu estômago revoltava-se com as misturas e, sozinho, ia deitar-se, não sem antes tomar algo para dormir...
           

Fevereiro de 2016
Matosinhos, Portugal


Cenotes de Cuzamá


            Foi em Mérida, México, que no ano passado sofri pela segunda vez uma otite. A primeira vez que senti essas dores horríveis, das piores dores físicas até ao momento (confirma-se mais uma vez como sou uma pessoa protegida e privilegiada), foi na Mina de São Domingos, em Mértola. Passava uns dias de férias de Verão com a minha querida amiga P. Uma das grandes companheiras da faculdade... e da vida.
            O motivo de ambas as otites é o mesmo: saltos para a água – mergulhos de cabeça que me mostraram que o sonho das profundezas dos mares e dos oceanos terá de se ficar pelo snorkeling – melhor que nada, como é óbvio.

            Como afirma o antropólogo francês David Le Breton, as cicatrizes de acidentes em actividades de risco, que os aventureiros tão orgulhosamente mostram, são memórias indeléveis no corpo de experiências vividas. As otites não deixam marcas visíveis, mas as dores que senti são revividas com um sorriso, ao resgatar as fotografias e filmagens do dia bem passado com Jacob – um dinamarquês de férias no México pela terceira vez! – nos Cenotes de Cuzamá, nos arredores de Mérida.
            Conheci Jacob no hostal Art Apart. O segundo em que fiquei nessa cidade mexicana. Reservara apenas uma noite no Nomads hostal. À chegada a Mérida, fiquei a saber que esse albergue estaria cheio nas noites seguintes: estava para chegar um grupo grande. Os meus lábios formaram um arco descendente – decorria uma aula de salsa à hora em que fazia o check-in e fiquei com vontade de desenvolver as minhas aptidões nas danças latinas. Paciência. Nada a fazer. Na manhã seguinte, enquanto tomava o pequeno-almoço, acontecia uma aula de yoga. Novo desapontamento por não ter reservado mais noites nos Nómadas de Mérida.
A duas quadras de distância encontrei o Art Apart. Ao entrar, o sentido do sorriso inverteu-se. Abriu-se ainda mais quando a senhora que me atendeu me mostrou o lugar, com uma piscina rodeada de decoração e mobiliário retro. Fiquei num dormitório do piso superior. Tinha dez camas. A única que se fez ocupada, durante a semana inteira em que aí parei, foi a minha! Muito grata pela tranquilidade do sítio, ao contrário do primeiro onde dormi, o qual estava ao rubro, cheio de gente, cheio de actividades. Na maioria das vezes, sou mais do género sossegado, por isso, posteriormente apreciei o facto de não ter tido cama no Nomads.

A dinâmica existente no Art Apart foi suficiente para travar conhecimento com gente nova, visitar novos lugares bem acompanhada e mesmo rever um casal que havia conhecido em Bacalar – a cidade de onde viajei até Mérida –, a Patrícia e o Arturo. Reencontro que me permitiria, semanas depois, uma estadia na Cidade do México.
Os dias em Mérida foram realmente muito bem passados, tendo para isso concorrido Alberto, o jovem responsável pelo hostal Art Apart. Alberto dava-se muito bem com Jacob, que já não era a primeira vez que ali ficava alojado. Foram várias as refeições que partilhámos os três. Jacob gostava de cozinhar, particularmente ovos, que os preparava de todas as maneiras e mais algumas. Da minha parte, contribuía com os legumes para a salada. Os abacates eram sempre um petisco obrigatório com um fio de azeite e sal a acompanhar os maravilhosos soft eggs do Jacob, de que fiquei fã.
Levaram-me a conhecer a la movida de Mérida. Fiz o gosto ao pé no bar ‘Fábrica de Mezcal’, onde também provei o famoso Mezcal e relembrei os shots de outros tempos com a Tequilla Bum Bum na Cantina ‘La Negrita’.
 Com Alberto, fiz o reconhecimento da cidade através das corridas matinais antes de ele começar o seu dia de trabalho. Foi também Alberto que me sugeriu a visita aos Cenotes de Cuzamá, onde fui com Jacob.
Às 9.30h da manhã de uma sexta-feira de Agosto, eu e Jacob estávamos prontos para ver ao vivo as cavidades naturais designadas de cenotes. São resultado do impacto de grandes meteoros, dando acesso a águas subterrâneas. Nestas grandes cavernas ter-se-ão realizado muitos rituais de sacrifício dos Maias.
Existem muitos cenotes no México, mas os de Cuzamá têm uma particularidade: o acesso aos mesmos é efectuado através de carruagens que são puxadas por cavalos ao longo de antigos caminhos de ferro. A nossa carruagem era uma das mais poderosas do lugar. O que eu e o Jacob nos rimos. Existia apenas uma linha. A nossa dúvida foi desvanecida quando nos confrontámos com a primeira carruagem que surgia no sentido oposto. As pessoas que nela eram transportadas foram convidadas a deixar a carruagem e a ajudarem o condutor a retirá-la da linha, para assim dar passagem, neste caso, à nossa. Isso aconteceu várias vezes em ambos os trajectos e nós ficámos sempre sentados à espera que as demais carruagens desamparassem o caminho para que, sempre nós, prosseguíssemos. Sentimo-nos reis e senhores dos carris de Cuzamá. 
 

Foi no último de três cenotes que mais tempo nos detivemos e onde saltámos vezes sem conta para a água, brincando, rindo e desfrutando da profundidade das águas límpidas e cristalinas. Jacob levara a sua máscara e foi aí que tive o primeiro laivo do esplendor do que é o mergulho...
 

Os dois dias seguintes em Mérida foram a relembrar vividamente cada salto, cada mergulho... os ouvidos não me deram descanso. A juntar à festa, a chuva tropical trouxe uma enxurrada de mosquitos. Pela primeira vez em três anos, tive necessidade de recorrer aos químicos de um repelente, a fim de apaziguar a superfície corporal. Tenho a sensação que o álcool do mezcal e da tequila, que ainda circularia nas minhas veias e artérias, terá tido a sua quota parte na atracção de tanto insecto....

Fevereiro de 2016
Matosinhos, Portugal

Na tua casinha... Querida avó!

Fotografia de Pedro Pereira

Querida Avó Altina!

Foste embora. Não sem antes nos despedirmos. Quando me viste na véspera de ires: “Oh, minha querida neta do meu coração... Vieste despedir-te de mim...” Olhei para ti e compreendi. Os teus olhos ainda mais pequeninos e muito vermelhos isso me sugeriram. Um fio, apenas, te prendia a este mundo. A tristeza envolveu-me, ao mesmo tempo que uma bênção me abraçava: escutara a tua voz nos dias anteriores e fui despedir-me.
Estavas presa a uma cadeira. Tiraram-te a autonomia, sentias. Protegiam-te das quedas, diziam. Estavas presa. Estavas protegida.
Deixaras de ser aquela pessoa alegre, livre e independente que todos admirávamos. Uma das irmãs coragem. A tua coragem mantinha-se, sem dúvida. Por isso compreendia a tua angústia, o teu desalento, a tua inércia... Estavas onde te haviam largado. Estavas onde te haviam protegido de ti própria. Mesmo que essa não fosse a tua vontade.
Os teus noventa e cinco anos tão cheios... Mas as tuas pernas, os teus pés... Já não tinham força para se elevarem o suficiente nas tuas parcas deslocações. Por isso, as quedas eram cada vez mais frequentes. Aquelas que assustavam cada vez mais aqueles que te amavam. E se caísses enquanto estivesses sozinha? E se te acontecesse alguma coisa e ninguém te pudesse acudir?
E ninguém estava disponível... Nem recebendo um pagamento para cuidar de ti... Na tua casinha. Não se encontrou ninguém para ficar contigo a tempo inteiro.
Foste para uma casa comunitária, onde estavam outras pessoas velhinhas como tu e a necessitaram de cuidados continuados. Não querias. A tua voz implorou tantas vezes e com tanta urgência: “Quero ir para a minha casinha”. Ninguém conseguiu dar ouvidos ao teu pedido, que afinal não era assim tão simples.
E começaste a recusar-te a participar nas actividades organizadas, naquelas que entretêm e ajudam a passar o tempo. E começaste a recusar a alimentares-te o suficiente. Ninguém reparou?
Só eu é que terei reparado que estavas a gritar com o teu silêncio, com as tuas recusas?
E decidiste. Já que não podias estar na tua casinha, livre e descansada, então mais valia partir. E a comida diminuiu ainda mais e nada mais havia a fazer a não ser esperar que a vida ela própria te escutasse, terminando-se... E assim foi. E foste. E partiste. Corajosamente, no teu tempo, porque assim quiseste.
Querida avó, dizem que as desculpas se evitam. Mesmo assim, eu peço-te desculpa! Desculpa por não ter tido o discernimento suficiente para ficar contigo, na tua casinha, nos últimos meses da tua vida, evitando, assim, que morresses no hospital, por falência total dos órgãos. Morreste do coração, disseram. E com efeito, foi uma dor no teu coração... Morreste de tristeza...
Desculpa não ter tido o discernimento suficiente para ficar contigo na tua casinha, mesmo que tal chocasse quem por ventura poderia tê-lo feito.
Bem sei que escrever isto é admitir que estou triste por esse por ventura.
Todavia, estou sobretudo triste por te ter visto, a ti e a outras pessoas, numa sala de entretenimento. Passivas. As pessoas ali estavam, sedadas, à espera que as horas de cada manhã passassem. Passivas, à espera que as horas de cada tarde passassem. Cada dia a passar lenta e demoradamente, sem se sentirem. Mas tu sentias. Eu senti a tua tristeza. Desculpa, minha querida avó, por não ter ficado contigo... Na tua casinha.
É isto que somos capazes de proporcionar aos nossos velhos? Àqueles que nos deram vida, que cuidaram de nós? Àqueles que nos ajudaram a crescer... A ser?
Enquanto escrevo, as lágrimas turvam os olhos e mal consigo perceber as palavras gatafunhadas. Mas o que escrevo é o que está cá dentro: uma tristeza imensa por não saber se saberei tratar dos meus futuros velhos... Não é ‘apenas’ por isso. Que pessoas somos hoje, que não temos tempo para tratar daqueles que trataram de nós?
É mesmo assim? Sedar os velhos, deixá-los numa sala à espera que as horas passem por eles? À espera que a morte os receba... Finalmente.
Oh, vó...querida avó.

15 de Fevereiro, 2016
Matosinhos, Portugal

Mochilando - Parte II




O ano passado a mochila estava forte e resistente, não tendo sido necessário usar o kit de urgência. Contrariamente a este ano. Ao fim de dois meses teve de ser. Em Lanquin, na Guatemala, foi necessário coser o bolso superior. Aí guardava aveia para o pequeno-almoço ou uma lata de azeite. É de salientar que o azeite é ouro na maior dos países onde estive na Améria Latina. Não gosto de cozinhar com óleo. É um gasto que parecendo de luxo, é elementar para a minha alimentação. Não sou a única a pensar desse modo. Nos hostels onde pernoitei era habitual esse tesouro estar protegido das mãos alheias. Como era o caso do italiano – o Mássimo – que conheci em Granada, na Nicarágua. A sopa que partilhou comigo tinha esse condimento tão mediterrâneo.
Mássimo chamou-me a atenção para um pormenor; só nesse momento identifiquei o que há muito me causava quase náuseas. O cheiro das mochilas. Insuportável. Um fedor que sobressaía em particular nos dormitórios cheios. Seis ou sete pessoas a dormir no mesmo quarto com as respectivas mochilas. Mochilas essas que passavam por todas as desventuras e mais algumas, entre porões de avião, de autocarro, barcos e chão. Muito chão, absorvendo todos os odores de cidades mais ou menos poluídas. A partir desse momento tornou-se quase intolerável trazer a mochila pequena na frente do tronco, afastando-a o mais possível das narinas. Havia ainda outro malfadado pormenor, cuja consequência se daria na Cidade do México, em casa de um casal que conheci em Bacalar. A mochila grande trazia uma recordação odorífera de Bogotá. Também nessa capital fiquei hospedada em casa de amigos que conheci o ano passado. Em ambas as casas havia um habitante felino. Ora, o gato colombiano fez questão de deixar a sua marca urinária. Ao pousar a mochila no quarto que me foi destinado na cidade mexicana, o gato que aí vivia sentiu – ao fim de mais de dois meses! – e não gostou. De tal modo, que quando tentei amenizar a aversão que sentira, saltou e mordeu-me!! A minha mão esteve inchada vários dias.
Quanto ao volume, a mochila ganhou algum em Mérida, no México (no final do terceiro mês), quando as sapatilhas adoeceram e deixaram de ser viáveis para a corrida. Só consegui despedir-me delas no Rio de Janeiro, cidade de onde regressei a Portugal. O seu conforto para caminhar mantinha-se e a cor roxa agradava-me sobremaneira. As roupas iam ficando em alguns dormitórios. Além do inevitável se ter repetido: quando mandava lavar a roupa o saco vinha quase sempre mais leve. Quando em Setembro comprei a viagem de regresso ao Porto, libertei-me de peças que roçavam o andrajoso. Na Costa Rica (início do quinto mês) disse adeus aos calções de guerra; os calções de montanha que tinham seguramente quinze anos de existência. Gostava muito deles, mas estavam tão esfarrapados... pelo menos ‘morreram’ num dos lugares mais bonitos, para mim, da América Central: o Parque Corcovado.
Também abandonei os segundos calções de corrida; não aguentaram as lavagens medíocres.
Daí viajei de autocarro para a cidade do Panamá, onde tinha voo marcado para o Rio de Janeiro. Já cheirava a maresia do Porto. Era então necessário criar espaço para os ‘regalos’. Foi no Panamá, a pouco mais de duas semanas do regresso, que finalmente dediquei o passeio às compras. Apesar dos esforços, o espaço era limitado. Adicionalmente, no Rio de Janeiro obtive a indumentária para o voluntariado num Evento-Teste dos Jogos Olímpicos – razão pela qual me desloquei ao Brasil –, o que aumentou novamente o volume.
A viagem desde o Rio para o Porto permitia mais bagagem de porão; conforme me sugeriu uma vendedora, podia ter comprado uma maleta. Mas isso já não é uma prioridade. Pela reacção do meu sobrinho depreendi que ele não esperava nada; o que muito me apraz. As cartas que lhe escrevi foram os melhores presentes – o que li no seu olhar profundo de longas e negras pestanas.
Quanto à família e amigos, as pessoas a quem fiz o carinho de trazer uma lembrança também a receberam num sorriso que revelava surpresa, tendo percebido que ninguém o esperava. O que me satisfaz imensamente. Ainda não sou capaz de chegar de mãos vazias. Na realidade, em cada encontro com alguém que não vejo há muito tempo levo um ‘miminho’. É fantástico o sorriso que recebo, nem que seja por uma simples flor. Além disso, como ainda tenho muitas coisas que não preciso, essa é uma forma de libertar espaço na casa dos meus pais.
Viajar de mochila tem sido uma aprendizagem ainda muito iniciática. Não é raro escutar: “Ui, tu viajas com isso tudo, com uma mochila desse tamanho?” Quase tudo é relativo. Estou certa que esta viagem de cinco meses se impregnou no meu ser e que na próxima serei capaz de diminuir o peso de forma substancial... estou a aprender a precisar de cada vez menos. Já nem perfume me lembro de usar, apesar de ter um ou outro frasco na cómoda.

Outubro, 2015
Matosinhos, Portugal

A flauta pan de Hanuko - Machu Picchu III



Tempo fugaz e fragmentado. Assim voam numa velocidade estonteante as horas, os dias... os anos – quando os sonhos estão presos, não nos atrapa sueños, mas em paredes de betão. Pedras, quantas vezes cinzentas, que não sabem que o sonho* é uma constante da vida bem concreta e que, só por medo, pouco definida.
As sombras silenciosas que as nuvens desenhavam nos cumes pintados de branco ressoavam no meu ser como um novelo infinito de horas lentas e espessas.
Os doze quilómetros de caminhada pela cordilheira andina conduziram-nos ao acampamento já montado. Dois grupos, dois guias. Nico e Edgar organizavam o jantar. Para o nosso grupo, metade das refeições era em modo vegetariano. Até ao momento em que abri este caderno, para traçar as memórias de final de Outubro de 2014, foi a mesa mais vegetariana em que me sentei (aparte dos retiros de meditação e restaurantes do género). Há que dizer que, durante esses dias pelos Andes, comi realmente muito bem – quem diria... numa cozinha improvisada. Os cozinheiros mereciam todos os dias palavras muito elogiosas, concretizadas numa ‘propina’ final à altura.
O ribeiro manso em serenos sobressaltos, sem pinheiros altos, mas com vegetação verde e oiro, agitando-se numa penumbra cada vez mais azulada, anunciava o descanso do guerreiro. Eram sete e meia da noite quando me instalei na tenda com Lúcia. Uma das vegetarianas, mãe de uma jovem brasileira – Melissa – que se fazia acompanhar do namorado australiano.
Oh, que dia! Eles não sabem nem sonham que o sonho comanda a vida. Que sempre que um homem sonha, nem sempre o mundo pula, nem sempre avança. Pelo menos nas altas montanhas andinas. Muito pouco sonhei nessas noites que partilhei a tenda com a senhora brasileira. A mais velha do grupo e sem ninguém com quem conversar a não ser a filha e eu própria – e mesmo assim mal.
Alguns dias antes, quando em São Paulo, em casa de H. e A., fui informada que, para além dos idiomas que procuro ir melhorando a cada dia, falava mais um. Dizia a empregada do casal que me recebeu: “Oi, Ana, você fala muito bem português!” – Claro, sou portuguesa! – respondi... Nessa época já me rendera ao inevitável; no país irmão, o meu falar era lento e com o máximo de sotaque e recorrendo ao uso dos pronomes pessoais e reflexos no modo ‘brasileiro’. Por isso, Lúcia tinha em mim alguém com quem conversar e alguém que a escutava... oh, como a escutava, em particular durante a noite, quando o seu respirar nada tinha de musical; pelo contrário, ultrapassava o razoável...
A música foi magistral ao segundo dia. A tela, a cor e o pincel da paisagem mágica do dia seguinte – uma bebedeira sob o azul celeste, em contraponto com a sinfonia verde e a água a cantar.
‘Kokoro’ – o coração da natureza estava na música que uma das caminhantes do grupo, Hanuku, soprava pela sua flauta pan. ‘En’ – a energia que eu sentia na melodia que roçava em cada poro da minha pele, no vale que a japonesa nos presenteou, como uma passarola pára-raio, locomotiva, desembarque em foguetão na superfície lunar.
A hora ainda não era de luar, mas de contemplação das regiões que desejava desérticas no meu coração. Talvez assim criasse espaço para as notas douradas que, num compasso de dança colombina e arlequim, me encantavam como uma bola colorida.

Ah... eles não sabem, nem sonham que, nas pedras em que me sentava, todos os meus sentidos convergiam para a brisa de uma flauta pan que tocava no centro do universo – a cordilheira dos Andes. Naquele momento nada mais existia. Só muito mais tarde me lembrava que caminhava lenta e serenamente em direcção a Machu Picchu.



Janeiro, 2016
Matosinhos, Portugal

* Intertexto com ‘Pedra Filosofal’, de António Gedeão

Longe do mundo... - Machu Picchu II


“Aqui está-se sossegado, longe do mundo e da vida”*. Ali estava sossegada, no centro da Natureza e da existência. Cheia de não ter passado, sem futuro – nada existia para além do meu peito, onde o coração se agitava em arritmia. Subia e subia, progredindo em altitude em cada passo cada vez mais lento. Não era apenas por reacção fisiológica à altitude. Ali, estava cheia e o coração batia tumultuosamente – estava viva. Caminhando... devagar. Ascendia pelo Salkantay trekking. O primeiro de cinco dias para, no último, chegar ao destino: a montanha de Machu Picchu; aquela onde, em 1911, Hiram Bingham encontrou as ruínas da civilização Inca.
Foi por sugestão de H. – que me recebeu juntamente com A., alguns dias em sua casa em São Paulo, depois do congresso – que optei pelo Salkantay trekking em vez do Inca Trail – o trekking mais famoso, mais turístico, mais oneroso (o triplo do valor do Salkantay trekking, apesar de também mais curto: três dias). Além disso, é usual ser necessário reservar com alguns meses de antecedência.
No dia em que fiz o check-in no hostal em Cusco – a minha estreia num albergue – reservei e paguei o meu lugar num grupo que sairia para o Salkantay trekking daí a dois dias. O tempo que me pareceu suficiente para me aclimatar minimamente. Afinal, acabara de aterrar em Cusco – a mais de três mil metros de altitude – e sentia-me exausta fisicamente. Com o pacote que comprara atingiria mais de quatro mil e seiscentos metros. Era a primeira vez que o meu corpo experimentaria os efeitos de caminhar tão alto.
Na véspera do trekking participei num torneio de ping-pong no Pariwana hostal. Achava eu que teria hipótese de ganhar pelo menos um jogo. Só porque no nono ano da escola secundária e no primeiro ano da faculdade ganhava aos rapazes. Fui eliminada no primeiro e único jogo! É necessário dizer, e com toda a verdade que me é possível, que tenho a certeza de ter sido roubada pelo meu adversário.
A derrota mal digerida foi de imediato esquecida quando, ao chegar ao dormitório, Sori, um rapaz de Chicago e de origem indiana, me ofereceu dois bastões de caminhada. Sori recebera-os de duas raparigas que os quiseram despachar – já não precisavam dessas próteses externas. Rob, o inglês que se despedia de Cusco na manhã em que eu me instalei, também deixara material no dormitório. Quando nos cumprimentámos, Rob ainda estava extasiado pelo mesmo trekking que eu desejava fazer. Porém, como a época das chuvas estava a começar – razão pela qual decidi ir directa de São Paulo – o inglês teve ‘azar’: choveu durante os cinco dias...
Meia hora depois, a derrota estava enterrada, para me sentar com Nico – o guia com quem tinha um briefing acerca dos cinco dias e quatro noites seguintes. Só depois fui comprar o que me faltava: água, papel higiénico, alguns snacks – poucos; o pacote incluía as refeições – e um saco, no qual ensaquei a minha parca existência material. Guardei na sala de bagagens do hostal, onde reservei mais duas noites para quando regressasse de Machu Picchu.
Às 3.40h da madrugada seguinte, saía com Nico e mais três raparigas – duas belgas e uma chilena. O espanhol chileno dominava – quase cumpria o meu sonho – já que todas viviam em Santiago do Chile.
“E no desdobre da memória, o viajante indefinido ouve contar-se só a história”, não do cais e do barco d’ ‘o contra-símbolo’ pessoano, mas a história que escutava na minha língua materna. A minha tentativa de dormitar um pouco, durante a viagem de autocarro até Challancha, foi interrompida pela conversa de três jovens a falarem português. Três estudantes do Porto a fazerem um ano de licenciatura em Lima.
Às seis e meia da manhã sentávamo-nos num café de Challancha para o pequeno-almoço; local onde deixaríamos a mochila com o máximo de cinco quilos – o peso que nos era permitido ser transportado pelas mesmas mulas que carregariam as tendas e provisões para o grupo de doze pessoas. O guia Nico fez as apresentações antes de partirmos às 7.40h, hora que começávamos o primeiro de cinco dias com destino a Machu Picchu. O ponto de partida fazia-se a 3300 metros de altitude; durante a caminhada desse dia alcançaríamos os 4600 metros... O campo onde pernoitaríamos seria um pouco mais abaixo, a doze quilómetros de distância.



Janeiro, 2016
Matosinhos, Portugal

* ‘Aqui está-se sossegado, longe do mundo e da vida’ – poema de Fernando Pessoa. Este e outros excertos do mesmo poeta ao longo do texto.