Isletas de Granada


           Numa noite enorme, o sono foi brando no silêncio pouco negro do hostal ‘Hamacas’, em Granada – Nicarágua. A viagem desde a cidade do México aconselhava a escolher um quarto privado. Partilhei as refeições e experiências com outros viajantes furtivos naqueles dias, mas era fundamental um quarto só para mim.
            Cheguei a Granada no dia nove de Setembro. No dia seguinte começaria o retiro de meditação do qual desisti algum tempo antes. Como tal, informei a organização com a devida antecipação. Desse modo, o lugar que me estava destinado ficou disponível para alguém na lista de espera. Refira-se que a oferta de retiros de Vipassana costuma ser inferior à procura, daí o meu cuidado.
É possível que a 'minha' vaga tenha sido ocupada por Amanda, uma norueguesa com quem conversei na noite de chegada. No dia seguinte, era ela quem iria para o centro de meditação. Recebera a notificação três dias antes: “Ah... que engraçado. Às tantas...”
Fui directamente do aeroporto de Manágua para Granada. Pelo que escutara, seria uma cidade pouco interessante com muitas histórias que não valia a pena confirmar. Não arrisquei e, como tal, continuo sem conhecer Manágua e sem saber qual o impacto da revolução sandinista na capital.
Quando ingressei numa visita guiada de lancha pelas ‘Isletas’ de Granada, percebi que existem muitos europeus a residir em Manágua, pelo menos temporariamente. Julie era disso exemplo – uma alemã de passeio em Granada com a sua mãe. Aproveitara a visita materna para conhecer a cidade do grande Lago Nicarágua e, assim, sair da capital por uns dias. Julie era professora de alemão e inglês numa escola privada em Manágua.
O amor... ah, o amor... Julie apaixonara-se por um ‘nica’ no ano anterior e não hesitou. Mudou-se de armas e bagagens para o outro lado do mundo, pelo menos por um ano. O namorado estava a terminar uma especialização e em breve iria realizar a sua dissertação de mestrado na Alemanha. Se a paixão perdurar ou evoluir para outro estado, Julie regressará à terra natal bem acompanhada.
A alemã, de olhos de um azul morno e sorriso imaculado, partilhou a sua história enquanto vagueávamos languidamente de lancha por entre as centenas de ‘isletas’ ao largo da costa. Ilhotas muito ilhotas que resultam da erupção do vulcão Mombacho há milhares de anos. Numa delas o Forte de San Pablo. Noutras, hotéis de pequenas dimensões – conforme a área disponível. A maioria das ilhotas eram privadas, residências de férias. Casas mais ou menos luxuosas, cuja arquitectura  nos provocava mais ou menos suspiros: ah, que varanda... ah, que janelas... ah, que casa linda para passar uns dias.
O azul esverdeado das águas era rasgado pela língua que a pequena embarcação desenhava com o leme. Sorriamos extasiadas, contornando ‘isleta’ atrás de ‘isleta’. Algumas garças marcavam o seu território, pairando-nos a dúvida se teriam apenas uma pata ou se estariam numa qualquer posição ‘yogui’ ou se estariam apenas a observar-nos, indagando-se, quem sabe nestes termos: “parece que nunca viram uma árvore com ‘monos’”. E de facto havia muitos macacos. Uma das ilhotas, que era propriedade de um médico veterinário e nas poucas árvores que tinham espaço para se expandir, os ramos estavam num frémito contínuo pelos saltos inquietos dos ‘monos’ de Granada.
A visita incluía um lanche de frutas muito coloridas: ananás, pitayas e manga e um sumo natural de ananás para mim e para a Julie e um sumo directo do coco para  a sua mãe – confesso que esta é uma daquelas coisas que sou incapaz de ingerir seja em que estado for... O coco provoca-me vómitos – literalmente. O que é uma pena, já que tem muitas propriedades e ainda por cima é tão económico. Mas as pitayas... encheram-me. Pelo sabor, pela textura e pela cor. A casca de rosa choque e o interior roxo quase me impediam de a comer pela sua beleza exuberante. Uma fruta tão bonita como deliciosa.
Sentadas na esplanada de uma das ilhotas, desfrutámos da vista enquanto nos contámos mais histórias vividas em terras latino-americanas. Dúvidas não havia: o castelhano era encantatório e tínhamos vontade de continuar a aprimorar as nossas competências nesse idioma quente e envolvente. Entre nós, porém, era em inglês que comunicávamos. Eu e Julie. A sua mãe pouco escutei. A senhora só falava alemão e eu ainda não me propus nesse idioma. Talvez seja tempo de pensar nisso. Afinal, com tantas pessoas alemãs lindas que vão entrando na minha vida, começo a achar que é uma falha não conversar na sua língua materna. Quem sabe se para o ano. Por ora tenho é de estudar francês. Amanhã tenho teste e ainda quero rever algumas regras dos COD e dos COI, que é como quem diz, dos complementos directos e indirectos*. À bientôt...

           
Março de 2016
Matosinhos, Portugal

* Alguns dias depois soube a nota: tive 16. Bem bom :)





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