Um postal de Déli *



Aterrei em Déli no dia dois de Fevereiro. Ainda estou nesta grande metrópole e, no dia em que escrevo, ainda é uma incógnita o lugar onde estarei neste subcontinente, aquando da leitura deste postal - chamemos-lhe assim.

É possível que as experiências anteriores, em cidades tão ou mais populosas, tão ou mais "caóticas" (para mim), tão ou mais coloridas, tão ou mais intensamente olorosas, com tantos ou maiores contrastes, me tenham 'preparado' para eventuais "choques". As ideias pré-concebidas, as expectativas (ainda) têm alguma influência no modo como dou os primeiros passos no desconhecido.

Foi necessário realizar algum 'trabalho de casa' antes de voar desde o Porto. De qualquer maneira, gostaria de ter a capacidade de me deslumbrar, qual criança sem passado, que se extasia com tudo, num contínuo de novidades.

Dentro das minhas óbvias limitações nessa matéria, procuro estar atenta e deter-me nos lugares sem comparar, sem julgar, sobretudo desfrutando, saboreando, escutando. Ou seja, percepcionando com receptividade o ambiente em que me encontro, que me rodeia, deixando-me envolver.

É com algum esforço, confesso, que aceito o ruído do trânsito (ora aí está uma classificação, e preconceituosa). Mas quando me abstraio dos sons mais fortes e intensos das buzinas a tocar continuamente  faz efectivamente parte das suas regras de condução , estou apta a levantar o olhar, a erguer os ombros e a inspirar profundamente, não apenas para sentir a imensidão dos aromas que se misturam, mas igualmente para apreciar as tonalidades que os envolvem, que lhes dão forma visual.

Iniciei o périplo no Sul de Déli, a pouco mais de cem metros do meu local de alojamento. Perguntei ao gerente do hostel se existia algo interessante nas redondezas. Rufu, o jovem moreno, ainda que de tez pálida, talvez pelos anos vividos fora da Índia, sugeriu-me ir até ao parque dos veados Deer Park. Se é verdade que reservei um quarto fora do centro, sabendo que existiria um parque nas proximidades, há que dizer que, pouco depois de ter entrado, estava agradavelmente surpreendida. O facto de não ter qualquer ideia quanto ao espaço, desencadeou uma série de sensações aprazíveis.

Entrei pelo portão que dava acesso ao campo dos veados, eram dezenas a materializarem o bambi da minha infância. Pacíficos e relaxados, nas suas vestes castanhas pintalgadas de branco, mantinham-se indiferentes aos humanos que os admiravam e guardavam memórias fotográficas.

Prossegui e quase fui atacada por um dos muitos macacos à solta, em busca de comida, saltando sobre alguém para arrepanhar o que tivesse nas mãos. Quis tirar uma fotografia e ter-me-ei aproximado em demasia, diria, e senti que estava a ser tão ou mais atrevida que os próprios 'monos'.

Essa primeira tarde em Déli foi intencionalmente descontraída, a fim de me adaptar ao fuso horário. As cinco horas e meia têm, sem dúvida alguma, efeito no meu ritmo circadiano. Passeando pelo parque, ia apreciando o lago habitado por patos cantantes e as ruínas que se impunham como barreira aos sons urbanos, nas quais muitos pares de namorados se compraziam no último fim de tarde da semana de escola.

Voltei ao parque dois dias depois para uma caminhada matinal. Os trilhos multiplicaram-se, os espaços ampliaram-se e muitos recantos revelaram-se. Muita gente a realizar as suas actividades mais ou menos físicas, mais ou menos meditativas: corrida ou caminhada estugada nos trilhos, musculação nas máquinas disponíveis, ioga no prado, meditação sob uma árvore. O parque dos veados exalava energia.

Os primeiros dias na capital política foram a visitar locais de referência. Comecei pelo Forte Vermelho, património mundial da Unesco, construído no século XVII, em Velha Déli. Surgiu da vontade do mesmo soberano mudar a capital do reino, depois da morte da sua mulher, para quem aliás terá mandado erigir uma das sete maravilhas do mundo Taj Mahal,. A denominação do Forte resulta da coloração das pedras que o edificam e ladeiam vários hectares que serviram de base à nova capital.

Talvez por ser Sábado, havia centenas de visitantes locais. Aliás, observei uma enorme afluência aos lugares com história ao longo dos dias. Merendei num dos muitos jardins do Forte, degustando duas 'samosas' vegetarianas (chamuças). Na verdade, a degustação tem sido um dos pratos fortes desta viagem. A cozinha hindu é rica em pratos vegetarianos, o que facilita a escolha. As especiarias tornam as comidas realmente quentes, picantes e até adocicadas. Um pormenor: a minha transpiração está picante e por vezes pressinto odor a caril.

Essas chamuças macias de vegetais foram apenas o início da aventura degustativa. Alguns dias depois fui a um casamento. Foi Sagar, um amigo que fiz no Rio de Janeiro, aquando dos Jogos Olímpicos, que me convidou a juntar-me à sua família. Essa foi uma experiência explosiva de sabores, com mais de cem bancas com iguarias de todo o país. Entradas, saladas, sopas, pães diversos, pratos principais, sobremesas, acompanhamentos, bebidas refrescantes que me demonstraram que o picante é muito diversificado, em especial quando mesclado com algo fresco ou doce.

Saí da cerimónia com pelo menos mais três quilos. No entanto, pensei que aquela era uma oportunidade única para experimentar a multiplicidade gastronómica, acompanhada de explicações precisas sobre o que comia e a sua origem.

Naturalmente que o casamento, com cerca de 800 convidados, ultrapassou a prova de delícias gustativas e aromas indianos. As vestes riquíssimas da maioria das mulheres enchiam os meus olhos. Cor de laranja, matizes de vermelho, cor de rosa, lado a lado com azuis e verdes diversos, roxo, cor de salmão, nos vestidos, saris e túnicas debruados a dourado nos mais finos tecidos. Não era o caso de Samiksha, a irmã de Sagar. A jovem de 22 anos, com bochechas cor de chocolate, explicou-me que quanto maior a proximidade à família dos noivos, mais cuidada e imponente é a indumentária. Não era, pois, o caso da família simpática que me acolheu em sua casa, cuja afinidade distante lhe permitiu fazer-se acompanhar-se de uma estrangeira.

O casamento foi o término de um dia bem passado com Sagar, que me levou a conhecer alguns dos seus lugares preferidos em Déli, nomeadamente o templo Kalkaji Mandir, onde os devotos da deusa Kali, como o meu amigo, se deslocam para a reverenciar. Aí tive a oportunidade de ser marcada pela tinta vermelha na testa e assim viver uma vida auspiciosa. A ver vamos.

O local estava repleto de pessoas crentes que faziam as suas oferendas - algumas notas, doces, flores muito amarelas, arroz que podiam adquirir numa das bancas - à sua deusa, ao mesmo tempo que proferiam e cantavam as suas preces. Como o templo de Lotus estava encerrado por ser segunda-feira, fomos almoçar ao mercado Khan que, segundo o meu amigo, é o mais caro da cidade e no qual é possível encontrar muitas marcas internacionais.

O templo que mais apreciei nesse dia foi de outro tipo: os jardins de Lodi. É nesse jardim com cerca de 90 acres que se encontram vários túmulos, entre os quais o de Mohammed Shah, que governou o norte da Índia na segunda metade do século XV e início do século XVI. Sentámo-nos por algum tempo, apreciando o local, observando os esquilos e respirando a vegetação colorida.

Este e outros locais que entretanto fui descobrindo, e certamente irei encontrar, são apenas alguns exemplos do contraste existente e que já me cativou. Se no meio de riquexós e carros e motas e bicicletas e mesmo senhoras vacas, o cenário pode ser cansativo, os espaços tranquilos são muitos e de fácil acesso.

Para além destes lugares e sabores, houve outras experiências. Mas um postal é um postal. Quem sabe envie outros aos leitores do Chapinheiro. Por ora fico por aqui, desejando que no dia 20 de Março a Primavera se espraie por todos os cantos e recantos de Nogueira.

* Este texto foi publicado no Jornal Chapinheiro

Mascando paan



Conheci Rishabh Jain num dos muitos corredores de Chandni Chowok, o mercado de Velha Deli. Um dos rapazes de uma loja de tecidos desse mesmo mercado. O meu olhar deteve-se durante algum tempo numa pessoa que, bem sentada e muito compenetrada, preparava uma mistura e a espalhava numa larga folha de uma 'qualquer' árvore. Rishabh registou o seu nome no caderno, enquanto eu desfrutava de uma nova experiência. Pedi-lhe que escrevesse o que estaria eu a mascar.
Ficou assim respondida a questão que me havia colocado minutos antes, ao ver um outro senhor muito satisfeito a esticar com todo o cuidado aquelas folhas muito verdes.
 O qualquer ficou esclarecido. Era uma folha de pimenta de bétele. É nesta folha que se embrulha a tal mistura que o segundo artesão preparava com todo a arte: paan ou gutkha.
Paan - noz de areca - é então a semente triturada que, depois de misturada com outras substâncias, como a pimenta e ervas, se masca durante alguns minutos. De acordo com a descrição escrita do jovem vendedor, além da pimenta, paan pode incluir tabaco e nicotina. Isso mesmo me deixara curiosa, enquanto observava  o artesão a espalhar com a sua espátula as diversas substâncias, que ia retirando de diferentes potes. Segundo outras fontes, leva ainda cal e a sua constituição depende da zona onde é consumido. Sendo algo novo, e sendo possível 'personalizar', Rishabh traduziu o meu pedido ao velho homem. Que, por favor, anulasse a nicotina, o tabaco e a cal. Teoricamente algo menos nocivo.
Segundo outras fontes, o paan tem efeitos semelhantes aos do tabaco.
Compreendi assim a razão de ser de tantos homens cuspirem para o chão. Ao fim de poucos minutos eu já não sabia o que fazer com os restos na boca. Fiquei ainda a saber o motivo de tantos homens terem os dentes coloridos de vermelho.
Aparte de resquícios da folha, senti uma espécie de quase náusea, duas horas depois. Tendo sido apenas quase, valeu a pena pelo tempo que contemplei o velho artesão a preparar os embrulhos de paan, assim como pelo parágrafo no caderno. Ainda que Rishabh Jain tenha tido muito gosto em conhecer a senhora Ema.

3 de Fevereiro, 2018
Nova Deli, Índia 

Terminal de aeroporto



Pode dizer-se que esta nova aventura começou ainda no Porto, na chegada ao balcão da companhia aérea turca para efectuar o check-in. Os passageiros com destino a Nova Deli, com ligação em Istambul, ficaram em terra. Exagero.
Foram somente recambiados para Madrid, sendo 'convidados' a voar com uma das subcompanhias da Ibéria. Na capital espanhola, em vez de uma hora de escala, conforme o plano original de voo, seriam sete.
A bem da verdade, esse terá sido um risco tomado pelos próprios passageiros. Quem é que compra uma viagem com uma hora de escala entre dois voos? Várias pessoas!
Ora, como o primeiro voo, desde o Porto em direcção a Istambul atrasou uma hora, a companhia aérea logo agilizou a situação. Por conseguinte, à hora prevista estavam aqueles passageiros mais arrojados, entre os quais duas famílias indianas com diversos volumes devidamente protegidos a plástico aderente e mais duas outras crianças de colo, num outro avião.
Não sei como é que as hospedeiras de terra resolveram essa situação da bagagem, dado que ao verem esse grupo aproximar-se logo se revolveram nas cadeiras, por detrás do balcão.
Isto de viajar com as companhias de baixo custo tem a sua ciência e cumprir ciosamente com o peso estipulado é um exercício nem sempre fácil.
Não seria de estranhar que a aeronave, visivelmente menos robusta, tivesse ficado ainda mais frágil com o acréscimo de malas e bagagens. Há que dizer que foi uma viagem em sobressalto constante. Talvez seja uma palavra muito forte, mas os ventos contra, numa velocidade estonteante, tornaram aquela hora nas nuvens num quase pesadelo.
Quase, uma vez que embora tenha enchido com todo o fulgor uma daquelas almofadas que se encaixam na nuca, não foi possível sequer dormitar. Logo, nem deu para passar duma eventual fase do sonho ao pesadelo.
O passageiro da frente falava como se estivesse num palanque, qual esquina dos falantes no Hide Park. Ainda que jovem estudante ansioso pelo seu segundo semestre de erasmus em Amsterdão, falava com os seus colegas - presume-se - com uma distinta colocação de voz. Augura-se um futuro político.
Daí que a trepidação, juntamente com o discurso (quase monólogo) do jovem apagassem o sonho de uma sesta. Era, com efeito, algo ansiosamente aguardado. Apesar do voo ser às 12:20h, eram cinco da manhã quando as pernas com síndrome de formigueiro não aguentaram mais o conforto da cama.
Desse modo, houve tempo para tudo e mais alguma coisa, nomeadamente para apreciar a Super Lua azul e/ou também  vermelha e tudo o mais no parque da cidade. Por conseguinte, houve oportunidade para mais uma despedida ao lugar mais bonito da cidade do Porto. Foi mais um até já, confiando-se num regresso em meados de Maio.
Por ora há que desfrutar da sanduíche e de do sumo natural que o voucher oferecido pela Turkish airlines permite. Há que dizer, todavia, que no balcão do Porto a informação foi distinta. Ali não podiam providenciar esse suplemento, sendo que os gastos seriam ressarcidos posteriormente. Hum... Além dessa dúvida, permanece a do paradeiro da mochila.
Aquando do check-in no balcão da companhia espanhola, a hospedeira não conseguiu despachar a mochila com olhos amarelos bem abertos para a Índia. A mochila estava bem identificada com uma etiqueta muito original oferecida pela amiga MA.
Assim sendo, seria necessário resgatar a senhora azul de olhos amarelos, com cerca de 18 quilogramas, no terminal 4 de Madrid (a ligação para Deli seria no terminal 1 com mais um check-in). Vá! Desta vez esse peso também se deve a uma garrafa de vinho do Porto muito embalada, mais um livro e mais dois ou três pequenos recuerdos, para alguma eventualidade.
De qualquer maneira, ao embarcar, uma das hospedeiras informou que afinal a mochila havia sido despachada para Nova Deli, actualizando, em conformidade, o canhoto do cartão de embarque. Bom, as expectativas, mesmo que sendo de evitar, são as de que às 11horas indianas de amanhã, aqueles olhinhos amarelos bem abertos sorriam muito ao rebolarem no tapete de entrega das malas. Já agora, o Sagar também agradece (e eu muito mais) que a garrafa de vinho Porto aterre intacta. A ver vamos...

01/02/2018
Aeroporto de Madrid, terminal 1

Há pessoas assim...*






A nove de Fevereiro de 1994 o Humanidade ganhava um novo alento. A esperança de um mundo mais justo era recuperada. Um ano depois de receber o Prémio Nobel da Paz, Nelson Mandela tornava-se o primeiro presidente negro da África do Sul.
 A dez de Fevereiro de 2017, outro homem manifestava ao planeta outras possibilidades de mudança: Barack Obama anunciava a sua candidatura à presidência dos Estados Unidos da América. E também Barack Obama viria a receber o mesmo Prémio da Paz.

Dois homens, de duas gerações diferentes. Em dois continentes, fazendo o que estava ao seu alcance para transformar o seu país, Mandela e Obama teciam a trama de um horizonte mais vasto que a sua cápsula. A imensidão dos seus actos expandiu-se a todos os cantos e recantos do planeta.
Ninguém terá ficado indiferente aos seus esforços. Há pessoas assim.
Ninguém terá desvalorizado a vida de reclusão por uma causa maior.
Depois de 27 anos de cativeiro, Nelson Mandela mostrou que o impossível não existe e que só o é na aparência. Lembrou-nos, igualmente, que “bravo não é quem sente medo, mas quem o vence”.
E 2018 é o ano de centenário do nascimento do prisioneiro 46664. Valerá a pena, por isso, parar e respirar e reflectir sobre o rumo a trilhar. Mantendo a esperança em cada representante da Humanidade, é possível vislumbrar um futuro animador. Sobretudo se cada um de nós se lembrar que faz parte de algo incomensurável e que cada gesto, por mais pequeno que seja, pode fazer a diferença. Qual bater de asas de uma borboleta a repercutir-se na brisa até ao outro lado do globo.
Defender e colocar em prática o Protocolo de Quioto é, parece-me, uma maneira de fazer a diferença, mesmo que ténue. A discussão deste protocolo terá começado em 1988, tendo entrado em vigor a 16 de Fevereiro de 2005, após ratificação da Rússia em Novembro do ano anterior. Com este protocolo, assinado e ratificado por 55 países, pretende-se reduzir em 55% as emissões de gases que provoquem o efeito estufa.
Portugal é um dos signatários desde 1998. Assim sendo, também os portugueses têm a responsabilidade de o respeitar. Em cada gesto, em cada escolha. Só desse modo poderemos contribuir para o presente e futuro de todos nós e dos nossos descendentes.
Ainda que o tema das florestas seja sensível, a sua protecção e preservação também depende, e muito, dessa consciência individual. Sabendo que em cada ser particular estará a totalidade do colectivo.
Ou seja, se cada pessoa se detiver alguns instantes por dia e decidir escolher (passe a redundância) com atenção, lembrando-se que as suas acções afectarão os outros, o ambiente que a rodeia e, no limite, o outro lado do mundo, certamente que contribuirá para alcançar a meta (a meu ver pouco ambiciosa) do Protocolo de Quioto.
De facto, Mandela e, posteriormente Obama e tantos outros, acreditaram no seu poder pessoal. Por vezes, tantas, não acreditamos que está em nós esse poder de transformar. Todavia, é em nós mesmos que começa a mudança. Por mais prosaica que seja a afirmação anterior.
Por conseguinte, a minha sugestão para este mês de Fevereiro, para este ano de 2018, é homenagear esse grande Homem que, desde a sua cela, nunca desistiu de contribuir para um mundo melhor. E uma das formas possíveis, para cada pessoa, individualmente, é tão-simplesmente realizar escolhas conscientes. Respondendo, por exemplo, à questão: quais são as consequências (conhecidas) dos meus actos?
Assim, ainda que não controlemos quase nada, temos capacidade para controlar as nossas opções.
Assim, ainda que (aparentemente) não tenhamos como mudar o mundo, temos capacidade para mudar os nossos gestos, as nossas palavras e até os nossos pensamentos...



Nota: No dia 10 deste mês será o segundo aniversário da partida da querida Avó Altina.

*Este texto foi publicado no Jornal Chapinheiro

Às vezes é assim...



Desenrugo o sobrolho, e desfiro ataques sobre as teclas. Desmanchando ilusões, procuro desconstruir um discurso desconexo.
Distingo, ao longe, a sombra de um sorriso. É destituída de interesse, a pessoa que o desfia. Os dedos prosseguem, sem que eu saiba para onde me levam. Sem que eu saiba qual é a palavra seguinte.
Nem sei como estas letras ficam gravadas neste espaço virtual. Só aqui. Porque cada vez que a tecla apaga, apaga mesmo. Nada fica neste lugar imaterial. Nada fica no meu espaço cerebral. Outro sítio incompreensível para a maioria dos mortais. E cá estou eu novamente neste tema que, de camada em camada, se cristaliza, não sei onde.
Finto o tema da (i)mortalidade e procuro o ideal no ar tépido da noite. Fujo das lembranças, mas a máquina do tempo está encravada. Fito a eternidade com máscara, escondendo os olhos cheios de pensamentos. A imagem é turva. A da memória de chumbo. Finjo que sou mais leve e voo para outras águas... em menos de uma hora.
O silêncio é de tal modo ruidoso, que qualquer lugar é melhor que este. Aqui não existem pensamentos vazios. As vozes são surdas e provocam o espírito mais absurdo.
Acelero. Tropeço nas horas. A fraqueza aperta os pulsos e quase caio. Prefiro voar. Num lapso de cálculo estou mais além. Sou noutro alguém.

19 de Janeiro, 2018
Matosinhos, Portugal

Ode a uma Música!


https://youtu.be/G6Kspj3OO0s?list=RDy_6ak9CYx48

            Escrevo no dia seguinte à morte de Dolores O’Riordan. Para mim, era uma pessoa muito querida. Não que a conhecesse, mas o facto de ter passado uns bons dias na sua cidade natal, Limerick, na Irlanda, faz-me sentir um pouco mais próxima da sua voz encantadora.
Dolores O’Riordan era a vocalista de uma banda de música rock que muito aprecio. E a sua morte emocionou-me profundamente. Por vários motivos. Desde logo pela sua juventude. Dolores, a cantora dos The Cranberries, viveu ‘apenas’ 46 anos. As aspas devem-se às expectativas que a famigerada esperança de vida contemporânea nos cria. Além disso, como me faltam ‘apenas’ dois anos para alcançar aquela idade, as circunstâncias da sua morte aumentam, diria de forma inevitável, a minha apreensão. Morte súbita – causa desconhecida.
Foi num romance de Pascal Mercier – Comboio Nocturno para Lisboa – que certas indagações ganharam forma, no que à morte concerne. Curioso é o facto de estar a escrever enquanto viajo de comboio desde Lisboa.... Dizia eu que certas questões se materializaram em palavras, dado que o autor suíço me ajudou a visualizar e assim a compreender a angústia face à possibilidade de morrer, bem como o receio, digamos assim, da morte de pessoas que me são mais ou menos próximas.
Quando me reporto à proximidade refiro-me em termos abrangentes. Há pessoas que desconheço fisicamente, mas em relação às quais sinto uma espécie de ligação. É o caso de Dolores O’Riordan. Ainda que não tenha tido sequer a oportunidade de assistir a um concerto da sua banda, o choque que a sua partida me causou ainda reverbera no meu ser.
Na verdade, a morte de outros artistas, cantores, intelectuais e outras pessoas publicamente reconhecidas, suscita-me tristeza. Claro que quando se trata de pessoas jovens, mais ou menos famosas, a incerteza quanto ao derradeiro fim, associada ao questionamento do sentido de viver, assalta-me, qual larápio dos homens.
Foi em 2009. Na primeira vez que li a passagem seguinte do referido livro, gastei uma boa quantidade de folhas a especular acerca da vida que projectara. Estaria eu a VIVER? 
 “E assim poderíamos descrever o medo da morte como o medo de podermos não vir a ser aquilo que aspirávamos ser, ou para o qual nos projectámos”.
Desde então que engendrei formas para estar aqui com outra atitude... Nem sempre do melhor modo.
De resto, os CD’s dos The cranberries foram a banda sonora de muitas viagens de carro, onde a voz de Dolores era posta em causa pelo volume da minha própria voz, ou das pessoas que me acompanhavam. Mais da minha. Gosto de partilhar a boa disposição, mesmo sabendo que por vezes posso ser excessiva, nomeadamente ferindo os ouvidos dos meus acompanhantes. Ou bem que se juntam à cantoria, ou têm de ser deveras pacientes e compassivos para comigo.
Voltando à experiência sonora que a esta artista me providenciou, e que muito agradeço, reconheço nela, bem como em todos os músicos e cantores, o poder de tornar certas vivências inesquecíveis e intemporais, nem que sejam ‘apenas’ alguns instantes num local, com alguém mais ou menos especial.
Quem não se lembra de lugares, pessoas ou mesmo experiências ao escutar determinadas canções? É o caso de Linger – é uma das minhas músicas preferidas. Há 25 anos que a escuto; quase sempre com os olhos emudecidos. Há músicas assim. Há vozes assim. E a de Dolores continuará a ecoar no meu coração...

16 de Janeiro, 2018
IC Lisboa-Porto

Porto, um caso de amor *




You know I love you so – cantavam dois dos muitos músicos que nos dias de hoje pintam a cidade do Porto. Em frente ao Cubo, na Praça da Ribeira, escutava um sentimento confirmado numa versão com sotaque desconhecido de Yellow.
A expressão ‘nos dias de hoje’ não é despicienda, tão-pouco é estranho escutar sotaques e idiomas diferentes entre o número crescente de estrangeiros que a visita. 












A cidade do Porto: quem a viu, quem a ouve. Os tons musicais variam em cada esquina, ou em frente a uma casa amarela, ou vermelha ou azul, com sons e ecos diversos. 

O centro histórico vai-se transformando, rejuvenescendo numa paleta de azulejos multicores, procurando manter a sua marca registada nas fachadas. É possível que a Rua das Flores seja um dos exemplos mais ilustrativos dessa renovação tão colorida e musical, quanto polémica, como se lê num protector de obra – ‘o turismo mata os bairros’. Será que quem escreveu se refere à Ourivesaria Aliança, onde a jóia é o chá, ou à mercearia das flores, onde há quem se deleite a degustar os produtos regionais, de preferência biológicos?

You know I love you so: Porto! No cais da Ribeira, local onde terminou a nossa visita, os acordes da guitarra embalavam como um barco rabelo. Se antes este tipo de embarcação trazia as pipas de vinho do Alto Douro, hoje é uma das opções para contemplar o Porto ao longo do rio. O Douro, que nessa quase noite de céu limpo, espalhava as luzes do Mosteiro da Serra do Pilar. Eram estrelas cintilantes que, na varanda do mosteiro da outra margem, convidavam à travessia da Ponte Luís I – um dos miradouros mais altos para apreciar a cidade. Outros há, como seja o da Vitória ou o do Jardim das Virtudes. Este é, aliás, um lugar muito apreciado para tomar um copo ao fim do dia, enquanto o sol se deita... devagar. O pôr-do-sol que a câmara fotográfica de Miguel, de origem senegalesa a viver em Barcelona, gravou quando lhe perguntei qual era a sua melhor fotografia até ao momento.
Também o nosso grupo aí se detivera antes de descer as escadas da Vitória, não apenas para registar o momento para a posteridade, mas igualmente para guardar uma memória gustativa. Por sugestão de um dos elementos do grupo, deixámo-nos ficar algum tempo na Taberna Santo António, numa das esquinas do Passeio das Virtudes. Rissóis de queijo, pasteis de bacalhau e mousse de chocolate: algumas especialidades da casa que tivemos oportunidade de provar, acompanhando com o vinho da casa, como o fizeram a Rita e o Filipe.

Isso foi depois da visita ao Centro Português de Fotografia, alojado na antiga Cadeia da Relação na Praça dos Mártires da Pátria. A exposição permanente do espólio de António Pedro Vicente, com uma quantidade e variedade de máquinas e material fotográfico desde a origem da fotografia, é imperdível para os amantes da fotografia. Também para os amantes da literatura do período do romantismo, já que foi nessa antiga prisão que Camilo Castelo Branco terá escrito, em duas semanas!, Amor de Perdição. Da sua então cela, a vista é de cortar a respiração, sendo a Sé Catedral o elemento mais proeminente de quem se deixa ficar por instantes que seja, e assim captar um pouco da magia da Sé... do Porto.

A magia pairou através de um casal de meia idade. Os chapéus que o senhor e a senhora traziam, aliados à elegância com que se moviam, como que flanando por entre as ‘celas fotográficas’, provocavam o nosso grupo, originando uma curiosidade quase generalizada. Não resisti. Sorrindo, elogiei o casal e perguntei se poderia fotografar duas pessoas tão bonitas como elas. Do alto de dez centímetros dos saltos dourados, a senhora de cabelos louros presos sob o chapéu preto anuiu com simpatia. Agradeci. A fotografia é apenas uma das provas de um amor sem perdição, mas em crescendo... Porto, you know I love so!


11 de Janeiro, de 2018
Porto, Portugal

* Texto escrito no âmbito do workshop de escrita de viagens ministrado por Filipe Morato Gomes

Feliz 2018!*





Feliz ano novo!
Feliz ano novo? E paf!! Uma grande estalada. Pfiu!! Mais um ano que passou? Trezentos e sessenta e cinco dias se passaram. E quem se deu conta? Foram vividos a correr, a caminhar, a voar, a flutuar? Qual terá sido a percepção de cada um de nós? A vê-los passar? A vivê-los intensamente? À espera de alguma coisa? À espera de alguém? O que fizemos para merecer todos esses dias acumulados na nossa existência? É apenas mais uma camada de horas, dias, semanas, meses? Ou podemos dizer que cada dia foi glorificado e digno de ser considerado pleno para a nossa existência?
Para mim, as questões não se ficam por aqui. Terminado mais um ano, que para mim coincide na perfeição com o término de mais um ano de vida, coloco-me perguntas que me auxiliem a compreender como vivi durante um ano. Se de facto terei vivido e bem ao longo de mais um ano. Para então começar, neste caso, 2018 de um modo mais consciente, mais focada, mais atenta.... Estabeleço um rol de indagações, por mais difíceis que sejam de responder, sabendo que só eu ganho em ser honesta.
Começo por relembrar os objectivos estabelecidos no início do ano. Quais foram alcançados e como? O que aprendi atingindo o que me propus? Em que medida valeu a pena? Quais foram aqueles que ficaram para trás e porquê? O que aprendi com esse, chamemos-lhe, desvio?
O que fiz pela primeira vez? Que novas experiências me foram permitidas viver? Em que medida terão sido adequadas? O que retive de útil para crescer?
Qual foi o episódio vivido mais relevante e porquê? De que modo essa ocasião me ajudou a ser melhor pessoa?
Onde fui pela primeira vez e com quem?
Quantos livros li e quais se salientaram e porquê?
Quantos livros não li e porquê?
O que escrevi e para quem e para quê?
E o que deixei de escrever e porquê?
Quem conheci de novo?
Quem reencontrei?
Quem perdi?
Quem ficou?
Quem partiu?
O que fiz para ser mais amorosa e compassiva comigo própria?
O que fiz para ser mais compassiva e atenciosa para com as pessoas que me rodeiam?
O que percebi ter deixado de fazer ou ser com as pessoas que me rodeiam? O que me impediu e porquê?
Qual foi o acontecimento nacional que mais me sensibilizou e porquê? O que fiz, o que poderia ter feito, o que não fiz e porquê?
Qual foi o acontecimento internacional que mais me sensibilizou e porquê? O que fiz, o que poderia ter feito, o que não fiz e porquê?
No fundo, estas e mais algumas questões contribuem para compreender em que medida sou e estou diferente, depois de mais um ano de vida. São elementos que concorrem para assimilar o que terei aprendido ao longo de doze meses, cinquenta e quatro semanas, trezentos e sessenta e cinco dias, oito mil setecentas e sessenta horas, quinhentos e vinte cinco mil e seiscentos minutos. Confronto-me com estes valores para, dessa maneira, me lembrar que afinal não foi assim tanto o tempo que me estava disponível e para me recordar que muitos (demais) desses minutos foram desperdiçados a vaguear num mundo que não existe, a deambular num espaço superficial. Confronto-me com estas somas para seguir o caminho de forma real, com pessoas e lugares reais para, assim, aprender a ser mais real.
Ao responder a estas questões sinto-me preparada para receber um novo ano de coração e braços abertos. E então, o meu desejo para mim e para todos os leitores e leitoras do Chapinheiro é que seja um muito feliz ano novo!
Que 2018 seja efectivamente de renovação, de renascimentos, de redescobertas, de religações, de recuperações e de reciclagens, até.
O ‘re’. O ‘re’ sem ser de repetição. Um ‘re’ de regozijo, de recomeço, de reencontros. Sem permitir, se quiser ir mais longe, que a repetição se reinstale. Recuperando e restaurando. Sim, recuperando e restaurando as matas, as florestas, as montanhas, as serras (talvez o exemplo mais preponderante para as gentes da nossa aldeia). Evitando que os erros se repitam nesta, como noutras matérias, e nesta, como noutras dimensões da vida.
Recomeçando com a consciência de ter aprendido. E que, por isso, seja também um ‘re’ de rejeitar. Rejeitando o que deixou de ser adequado e o que estava a mais. Recomeçando, sim. Retomando e reorganizando os caminhos e práticas que nos tornam mais atentos em relação à vida que nos é concedida viver.
E para recomeçar é necessário, pelo menos para mim, olhar um pouco para trás. Sem apego, sem dúvida, mas apreciando, avaliando cada instante, cada lugar, cada pessoa, cada experiência.
Só desse modo, parece-me, o caminho pode ser renovado, com todo o aprendizado alcançado, quer com erros, quer com sucessos (chamemos assim). Se possível, procurando compreender como se chegou aqui e, então, prosseguir. A sorte e o azar até podem acontecer. Mas creio que o meu futuro é resultado de um agir presente. E que o presente sucede de um agir no passado. Daí que quanto mais consciente se estiver em cada instante, mais presente(s) se terá e será no futuro.
Bom ano! Bons meses! Boas semanas! Bons dias! Desejo muitas horas e minutos felizes! Em lugares e com pessoas que possam ser relembrados em 2019 com um sorriso... enorme!
*Este texto foi publicado no Jornal Chapinheiro

Dia(s) das / nas montanhas...*






Há precisamente três anos, foi-me concedida a oportunidade de viajar durante mais de dois meses pela América do Sul. Parti em direcção a São Paulo, de onde voei para Cusco, Peru. Tive, pois, a possibilidade de caminhar vários dias pelas montanhas dos Andes, tendo como destino final Machu Picchu.

 De Cusco fui para a Bolívia, atravessei a fronteira com o Chile de autocarro para, então, cumprir um dos meus sonhos: pisar, tocar, cheirar, escutar, enfim, sentir o deserto de Atacama.

As crónicas da época, neste jornal, registaram algumas dessas experiências. Se regresso a esses lugares, pelo menos através das palavras, é pela necessidade que sinto de enaltecer (sempre) o dia 11 de Dezembro – a data escolhida internacionalmente para lembrar as Montanhas.

Em San Pedro de Atacama conheci uma chilena montanheira, a Cristina, que ficou em mim gravada. Para ela, como para mim, a imensidão dos Andes, a altitude das montanhas, o silêncio do céu – tão próximo que parece tangível -, o calor dos meus passos... lentos, são dos ‘meus’ tesouros mais preciosos.

Se no texto do mês anterior manifestei tristeza em relação aos incêndios e suas causas e suas consequências, também nas ‘nossas’ serras, desta vez prefiro focar-me na grandeza das montanhas, enfim, na grandeza da Natureza e da qual todos somos parte.

A primeira palavra que me ocorre quando penso na montanha é Paz. É possível que tal impressão advenha do som do silêncio e da vastidão que o horizonte percepcionado no alto de um monte, de uma colina, de um pico me proporcionam. Quando a opção recai sobre uma serra mais árida, como a Serra da Freita, o vento na vegetação rasteira, pintada pelo lilás da urze, as melodias de algumas aves ou mesmo o crocitar de algum falcão, são os cantos dos seres que me acompanham. É com atenção que cada passo é dado. Os meus passos e os da minha companhia são os elementos sonoros mais fortes no instante.

Os cinco sentidos ficam em alerta máximo. Se me permito estar e ser em comunhão com a montanha, sou capaz de captar o som mais longínquo, sou capaz de cheirar o odor mais ténue. E, se num dia soalheiro, os meus braços nus são capazes de se arrepiar com uma leve brisa aconchegante. As inúmeras e intensas tonalidades de azul, verde, castanho, lilás, amarelo.... cores que os meus olhos captam sempre com uma mensagem instantânea ao cérebro: parece que aqui tudo é mais vivo, mais real. Pressinto que seja o mais real e verdadeiro que me é permitido sentir, escutar, cheirar, ver, Ser...
Às vezes, páro e fico então com mais elementos para as dúvidas que tanto me perseguem. Mas afinal é tão simples. Mas afinal talvez seja possível viver de forma mais simples, quem sabe mais plena. Porque é precisamente a sensação de plenitude, de totalidade, que os montes e montanhas do Gerês, por exemplo, me concedem.

Às vezes, quando regresso ao bulício, as vozes interiores não cessam. Grasnam, crocitam, uivam, piam, ladram, até... e surgem, então, novas questões... e pergunto-me amiúde se me lembrasse a cada instante que, como todos os seres vivos, sou Natureza e que temos todos a mesma importância, continuaria a agir da mesma forma em relação a tudo e a todos os que me rodeiam.


Se me lembrasse que ao ferir qualquer ser vivo estou, no fundo, a ferir parte de mim, já que os outros seres são uma continuidade de mim, formando a totalidade da Natureza... talvez mudasse um pouco mais a cada dia...

Se me lembrasse sempre desse princípio, que me parece básico, estou certa que jamais voltaria a tratar de modo inadequado a montanha, o rio, a floresta, o mar, os animais, as pessoas...

Creio que uma das formas ‘simples’ de ajudar a alterar a percepção que temos do mundo, do qual fazemos parte é, precisamente, experimentá-lo, vivenciá-lo de forma total, presente. A título de exemplo, é minha convicção (vale o que vale) que, se passássemos mais tempo na montanha, teríamos acesso às suas qualidades: do silêncio, grandeza, beleza, pureza... generosidade incondicional!

A gratidão perante tal generosidade é o sentimento que me envolve sem cessar quando regresso da Montanha...

Creio que se nos lembrássemos todos da nossa pequenez, e simultânea grandeza, seríamos um pouco mais compassivos, condescendentes e amorosos em relação a todos os seres, tal qual a montanha, as montanhas, a serra, as serras o são, oferecendo-se, dando-se incondicionalmente a quem quiser receber o seu ar puro e fresco, o seu aroma doce, a sua música harmoniosa...

Finalmente, que todos os dias sejam dias das montanhas. E que cuidemos um pouco melhor das nossas serras mais ou menos estreladas.




*Este texto foi publicado no Jornal Chapinheiro