Foto de Ema Magalhães: http://awondrousday.blogspot.pt/2016/09/balanco-verao-taking-stock-verao.html |
Outono em Nogueira do Cravo. Outono no Porto, em Matosinhos, onde me
encontro no momento.
Outono no Parque da Cidade.
As folhas caídas no piso de terra gentilmente batida pelos jardineiros
cuidadosos. Aqueles que todos os dias abraçam o céu silencioso. Umas vezes mais
azul, como hoje, outras vezes mais escuro.
Hoje, o céu era de muitas cores ao amanhecer. O sol nascia extravagante,
irradiando-se com requintada elegância para todos aqueles que de manhã cedo
caminhavam com mais ou menos vigor, prestando mais ou menos atenção à beleza
que se espraiava de forma bondosa.
De olhos bem abertos, recebia o amarelo dourado que tocava as minhas
retinas. Inspirava o suave odor do Outono e guardava, sem acorrentar, a
sinfonia matinal das aves que, parecendo bordejar, se organizavam antes num
coro altruísta para quem quisesse escutar.
No chão macio, folhas e folhas e folhas. Tonalidades diversas que
variavam entre o castanho terra até ao vermelho quente, com formas que
confisquei em três ou quatro para terminarem o seu processo de secagem no meio
de outras folhas – as de um livro...
Outono na Quinta de Monserrate.
O marmeleiro continua a oferecer fruta madura. A tigela de marmelada já
se esvaziou. O pote de geleia ainda permite alguns lanches.
A generosidade prolifera e o castanheiro lança a cada dia algumas
castanhas, como quem sabe que o Magusto não tarda. Acumulando o suficiente – o
suficiente é suficiente – para que a mesa seja farta de castanhas assadas ou
cozidas, com sal, muito sal.
Mesmo que a tensão esteja um pouco alta – no meu caso com frequência
muito baixa – não há como segurar a mão, quando se trata de espalhar as
castanhas num tabuleiro pronto a entrar no forno. Um pequeno delito à saúde,
que se compensará, decompondo sem esmorecer os resquícios de uma tarde ou noite
bem passada, em boa companhia regada como outra dádiva da natureza: jeropiga ou
vinho ou chá. Ou o que apetecer ou mais se apreciar. A Natureza é farta e
deveras generosa. Partilha o tanto que tem ‘sem olhar a quem’ e sem esperar
nada em troca. Não necessita de um dia para se lembrar que a ‘gentileza gera
gentileza’ – um dos slogans do Rio de Janeiro, que no dia 13 deste mês
se recorda, me recorda, nos recorda que a bondade, a gentileza é natural, faz
parte da nossa natureza, é o estado natural da Mãe Natureza.
A abundância que a Natureza gera é gentilmente concedida em cada
instante.
As cores, os cheiros, os sons, as texturas e as formas do Parque da
Cidade nesta manhã, são apenas uma das suas contínuas oferendas.
Ao chegar a casa, outras havia. Do castanheiro saltavam mais umas
quantas castanhas. O marmeleiro estremecia como quem se abana para soltar o que
tem a mais: marmelos maduros prontos para se transformarem em marmelada e
geleia deliciosas.
Questiono-me, então, que tenho eu em mim, quem sou eu um pouco mais
para, como a Natureza, gerar uma gentileza que gere outra gentileza... a cada
dia...
*Este texto foi publicado no Jornal Chapinheiro
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