Solidariedade*





O dia 6 de Agosto é internacionalmente dedicado à Solidariedade (o dia de aniversário do Tio Zé Alberto - o benjamim dos Nunes Pereira; aproveito para o felicitar).
Ciente das minhas limitações, questiono-me amiúde acerca do mundo que me rodeia e em que vivo, acerca dos seres humanos com quem me cruzo e com quem interajo e me relaciono de modo mais ou menos próximo.
Apesar da fragilidade do que vou publicando, e admitindo que poderia aprofundar mais, acredito e confio que a partilha de determinadas ideias e até mesmo anseios pode suscitar, pelo menos, alguma reflexão por parte dos leitores. Por conseguinte arrisco no tema da solidariedade.
Comecei por perguntar a diversas pessoas o que compreendem por solidariedade e se se consideram pessoas solidárias. As respostas foram várias, o que sugere um entendimento diferenciado do conceito. Não obstante, todas detinham um ponto em comum: a ideia de partilha.
Segundo um dicionário, a solidariedade é o sentimento que leva a prestar auxílio a alguém; é a responsabilidade recíproca entre os elementos de um mesmo grupo (social, profissional, institucional ou de uma comunidade); é a adesão ou apoio a uma causa, a um movimento ou princípio; pode ser também o sentimento de partilha do sofrimento alheio.
De acordo com outro dicionário, a solidariedade é um acto de bondade com o próximo ou um sentimento, uma união de simpatias, interesses ou propósitos entre os membros de um grupo; é a cooperação mútua entre duas ou mais pessoas; é a interdependência entre seres...
Quanto aos sinónimos, entre outros encontram-se os seguintes: ajuda, amparo, apoio, companheirismo, interdependência.
Cooperação, interdependência, partilha, reciprocidade - elementos inerentes à ideia de solidariedade.
Quando agimos e vivemos em cooperação, estamos atentos às necessidades dos outros. Nesse agir, é mais do que frequente que recebamos ajuda alheia para alcançar os nossos próprios intentos. Mais do que isso, é usual que, em situações de competitividade, a cooperação seja fundamental para o melhor cumprimento de objectivos mútuos, ainda que pessoas ou empresas ou instituições ou clubes, etc., sejam concorrentes entre si.
A interdependência pressupõe que estamos todos dependentes uns dos outros. Por mais independentes que aparentemente sejamos, é indubitável que sozinhos (quase) nada possamos fazer, que sozinhos (quase) nada possamos ser. Sendo certo que as circunstâncias em que nos encontramos em cada instante decorrem do contributo de muito mais pessoas (e instituições) do que aquelas que conhecemos. Motivo pelo qual, aliado ao conceito de solidariedade, está, inevitavelmente, o sentimento de gratidão. Pelo menos para mim.
Adicionalmente, não há como descartar o facto de sermos todos, sem excepção, seres vivos da mesma Natureza. Cada ser vivo tem o seu papel e função no ecossistema do qual faz parte, influenciando e sendo influenciado por outros seres vivos. E cada ecossistema interage no seu todo com todos os outros ecossistemas, de forma mais ou menos visível, mais ou menos intensamente. As repercussões são incalculáveis, são intangíveis. Depreende-se ‘apenas’ que as vidas estão todas ligadas, que estamos todos ligados, que dependemos todos, sem excepção, uns dos outros.
A reciprocidade surge, assim, de forma natural, como natural poderia ser partilhar todos os bens materiais e imateriais que nos estão disponíveis. Sim, disponíveis hoje, mas não necessariamente amanhã. Parecem ser ‘nossos’ hoje, mas a posse, não só é relativa, como momentânea e, com frequência, até aparente.
É neste contexto que a solidariedade pode ser vivida de forma contínua, sem pensar, sem hesitar. Basta que estejamos um pouco atentos para, em momento algum, nos esquecermos que se alguém necessita de ajuda, esse mesmo alguém poderíamos ser nós próprios. E se alguém está a passar por uma situação difícil, é possível que também nós ou uma pessoa que nos seja muito querida venha a passar por algo semelhante. E mesmo que tal, aparentemente, seja totalmente improvável, que importância tem isso?
Relevante é o facto de alguém estar a precisar de ajuda e, estando nós mais ou menos próximos, com mais ou menos capacidade para intervir, tenhamos pelo menos o cuidado de olhar para a pessoa de forma compassiva, de forma empática.
Por vezes, para ser solidário basta olhar, sem desviar o rosto, sem desviar a atenção. Basta reconhecer que o outro é um prolongamento de nós próprios... E isso, sem dúvida, faz toda a diferença!


*Este texto foi publicado no Jornal Chapinheiro

Amigo*





 







Amigo, toma para ti o que quiseres,
passeia o teu olhar pelos meus recantos,
e se assim o desejas, dou-te a alma inteira,
com suas brancas avenidas e canções.

Amigo - faz com que na tarde se desvaneça
este inútil e velho desejo de vencer.
Bebe do meu cântaro se tens sede.

Amigo - faz com que na tarde se desvaneça
este desejo de que todas as roseiras
me pertençam.
                               Amigo,
se tens fome come do meu pão.

Tudo, amigo, o fiz para ti. Tudo isto
que sem olhares verás na minha casa vazia:
tudo isto que sobe pelos muros direitos
- como o meu coração - sempre buscando altura.

Sorriste - amigo. Que importa! Ninguém sabe
entregar nas mãos o que se esconde dentro,
mas eu dou-te a alma, ânfora de suaves néctares,
e toda eu ta dou... menos aquela lembrança...

... Que na minha herdade vazia aquele amor perdido
é uma rosa branca que se abre em silêncio...

A 12 de Julho de 1904, Chile era o país onde nascia o grande Poeta do amor – Pablo Neruda.
Vencedor do Prémio Nobel da Literatura em 1971, a poesia do chileno canta o Amor de uma forma extraordinária. Mas Neruda também exaltou a Amizade; exemplo disso é o poema ‘Amigo’ – a minha escolha para celebrar a amizade, com o dia 20 dedicado ao Amigo.
                  Todos aqueles que têm bons amigos sabem e sentem que a amizade é, provavelmente, a ligação mais forte, duradoura, segura, diria mesmo mais tranquilizadora, que se pode viver.
                  Viver – a palavra não é aleatória. A Amizade vive-se, cultiva-se, fermenta-se, rega-se, alimenta-se... Mas mesmo que se passe uma eternidade sem que nenhum dos verbos seja colocado em acção, um bom amigo é sempre um bom amigo. Está lá, está ali, está aqui, está em nós. Baste que ele acene e vamos. Baste que o chamemos e ele acorre.
                  O amigo – e aqui a palavra é sem género ou sexo – é sempre um Amigo.

                  Neste mês de Julho vale a pena evocar (novamente) Nelson Mandela. No dia 18 comemora-se o centenário do seu nascimento. Um século de histórias, um século de lutas pelos direitos humanos. Um século de vidas perdidas e muitas vidas ganhas. Um século de coragem – disso não restam dúvidas.
                  O Homem que se desenhou, projectou e concretizou para um país mais justo e tolerante.
                  Invocar determinadas pessoas é lembrar que a sua história, dedicação e caminho não terminam com a sua partida. De facto, o modo como outros apartheids surgem e crescem (!!??) demonstram como a humanidade ainda tem tanto a fazer, tem tanto a aprender, no que à tolerância e solidariedade concerne.
                  Creio que essa aprendizagem e evolução é muito mais simples do que aparenta ser. Bastaria que aqueles que constroem muros e barreiras se colocassem um instante (eterno), que fosse, no lugar daqueles que sofrem as consequências desses mesmos muros e barreiras. Mesmo que seja um cliché...



*Pablo Neruda, in "Crepusculário"
Tradução de Rui Lage

PS: Este texto foi publicado no Jornal Chapinheiro

Let yourself go by the child you once were*




Let yourself go by the child you once were. An advice from the king Dom Duarte, that I read in a José Saramago’s book.
June starts celebrating the World Children’s day.
If I let myself go by the child I once was, and if I surrender myself to the child that still lives within me, I’m sure that I’ll be better prepared to reverence myself to the children that surround me.
            That’s the meaning of the June first. To reminds us that it is fundamental to unconditionally love each little boy and little girl. Be him or her more or less close to us.
If I forget myself... If I forget the adult personality in which I turned to...I'll have the space to offer to the little girl that I still am and that I still want to be. If this happens, I’ll be able to play with the other children. Only then I’ll understand how to provide them the indispensable space they need, and they are entitled to. The space to be and to continue being the children they are as long as they are children.
If the children can still be children, they will be able to keep on dazzling themselves: one of the most beautiful abilities of human existence. Being amazed with a drop of rain, with a fluttering butterfly, with every rainbow, with each ray of sun touching the skin, with each bite of chocolate cake, with every leap into the unknown…
Let yourself go by the child you once were and notice and let yourself be in each moment. Don’t lose yourself with comparisons and assumptions. Only then you’ll not lose yourself in that past that no longer exists. Only this way you’ll not lose yourself in such an unpredictable future.
There’s only one thing that the child who dwells in me aspires: playing here, playing here for just another minute, just one more time, the last one, the last of the last… even if she is crying of sleep. This is just because there’s no child to whom time is understandable. In fact, there’s no child who can catch up this anthropological coordinate. It does not exist. Every single child lives at the present time. Only now exists.
Oh… I wish I could be that child who stayed there… ah… and then I take a deep breath, trying to forget all those grownups that surround me. Instead, I reach for my beloved nephew Rodi. For this three years old child there’s nothing else than this moment. Tomorrow is an enigma that he not even wants to understand. So, we run after the ball and score just one more goal. So, we run and hid behind the coach just once more. And jump the wall just once more.
Even if, from time to time, the memory trips me and shoots an image of a jump that went bad and made me break a tooth, and almost the nose. And again shoots another image of me going bleeding to the hospital. And? I was playing. And I was playing with other boys and girls in the street. And we were running and jumping and hiding and showing up running and jumping. And if I was the last one, I’d run even more and even faster and I’d touch the wall and I’d shout out loud: 1,2, 3 ana saves every one.
Till the moment that moms would notice the stars in the sky and would call those still playing in the street. Fearless of darkness. Fearless of nothing.
Children are born without fear.
Fear starts with the adults. In their fear of losing their children, adults inculcate them their own fears. And that’s when the monsters, policeman and the big bogeyman show up...
            Even today, even under a torrid sky, I must cover my feet while I sleep. Who knows if the beast underneath my bed comes and eats my feet...
Let yourself go by the child you once were and forget about yourself…

PS: To José Saramago’s memory, who died on June 18, 2010


 *To celebrate World Children’s day.

Deixa-te levar pela criança que foste...*



Deixa-te levar pela criança que foste. Um conselho de El-Rei Dom Duarte, citado por José Saramago.
Junho começa com a celebração mundial da Criança.
Se me deixar levar pela criança que fui, e me render à criança que ainda aqui vive, estarei certamente muito mais apta a reverenciar as crianças que me rodeiam.
O dia 1 de Junho é para nos lembrar isso mesmo: é fundamental amar incondicionalmente cada menino e cada menina, seja ele ou ela mais ou menos próximo ou próxima.
Se me esquecer de mim e da personalidade adulta em que me tornei, dou espaço à menina que ainda sou e quero ser. Se tal se concretizar, serei capaz de brincar com as outras crianças e, desse modo, compreender como lhes posso proporcionar, providenciar, conceder, partilhar o espaço e o tempo que necessitam, a que têm direito, que lhes é imprescindível para serem crianças e continuarem a ser crianças enquanto forem crianças. Sem terem de se lembrar como é ser criança.
Se assim for, se assim forem crianças, manterão uma das capacidades mais bonitas da existência: a capacidade de se deslumbrarem em cada instante. Deslumbrando-se com cada gota de chuva, com cada borboleta a esvoaçar, com cada arco-íris, com cada raio de sol a tocar na pele, com cada trinca numa fatia de salame de chocolate, com cada salto no desconhecido...
Deixa-te levar pela criança que foste e repara e deixa-te ficar também em cada momento, sem te perderes com comparações e suposições. Só assim não te perderás num passado que não existe mais, tão-pouco num futuro impossível de prever.
A criança que em mim habita só deseja uma coisa: brincar aqui, só mais um minuto, só mais uma vez, a última, a última das últimas... nem que esteja a chorar baba e ranho de sono. Tão-somente porque em cada criança que conheço, a coordenada do tempo é-lhe difícil de alcançar, diria mesmo impossível. Não existe. Só o presente em que vive.
Ah... quem me dera ser só aquela criança que lá ficou. Ah... mas então inspiro profundamente e procuro esquecer as personalidades adultas que me rodeiam e procuro ser envolvida pelo Rodi (um dos meus amores...). Nos seus três anitos ainda subsiste só este instante. Amanhã é um enigma que nem sequer pretende entender. Por isso corremos atrás da bola e marcamos só mais um golo. Por isso corremos e escondemo-nos atrás do sofá só mais uma vez e saltamos o muro só mais uma vez.
Ainda que, de quando em quando, a memória passe uma rasteira e atire a imagem de um salto que correu um bocadinho mal e me fez partir um dente e quase o nariz e atire outra memória ainda que me levou para o hospital a jorrar sangue. E? Estava a brincar! Estava a brincar na rua com os outros meninos e meninas e saltávamos e corríamos e escondíamo-nos e aparecíamos a correr e a saltar. E se fosse a última corria ainda mais e mais depressa e tocava na parede e gritava alto e feliz: 1,2,3, ana salva todos.
Até que as mães viam as estrelas e chamavam os que ainda andavam na rua. Sem medo do escuro. Sem medo de nada.
As crianças nascem sem medo. O medo começa quando os adultos, com medo de as perderem, lhes inculcam os seus medos. E então aparecem os polícias ou os monstros ou os papões...
Ainda hoje, mesmo debaixo de um céu tórrido, tenho de dormir com os pés tapados. Sei lá se o bicho que está debaixo da cama vem e come os meus pés.
Deixa-te levar pela criança que foste e esquece-te de ti...


PS: À memória de José Saramago, que morreu no dia 18 de Junho de 2010

*Este texto foi publicado no Jornal Chapinheiro



Caminho térreo para a Índia...*

Templo Dourado, Amritsar

Escrevo à beira-rio, a ver os elefantes passarem... Em Chitwan, a cidade de onde regressarei à Índia daqui a uns dias, com intenção de visitar Dharamshala, no Estado Himachal Pradesh. Aí vive Dalai Lama, exilado do seu país, o Tibete, considerado território chinês desde 1950. A invasão da China transformou, adulterou, destruiu uma cultura, um país, em nome da sua "libertação pacífica" face ao império da Índia britânica. Invasão sobre invasão, o Tibete continua a ser um anexo chinês, cujo controlo se repercute muito além da geografia.
 
Cerimónia Kalachacra, Templo Dalai Lama, Dharamshala

Os assuntos geopolíticos não são um assunto fácil. Não obstante, quando se adentra um pouco mais por outras realidades e contextos, as influências sócio-políticas ficam mais evidentes, com implicações e repercussões não apenas sobre os destinos a conhecer, mas sobretudo nas práticas quotidianas das respectivas populações. É difícil ficar indiferente, mesmo que o tema da territorialidade e das fronteiras políticas me intimide. É com demasiada frequência que estas linhas imaginárias que os homens criam resultam em conflitos, na sua maioria armados. Conflitos apenas termináveis para os que perecem durante essas guerras.


Dada a natureza pacífica do povo tibetano, o "acordo" foi assinado, mas uma grande parte das gentes exilou-se no mencionado Estado do norte da Índia Himachal Pradesh. Arrisco, por isso, a atravessar novamente a fronteira de autocarro (o corpo ainda se lembra das quase 40 horas sobre rodas) em direcção a Déli.

Não arrisco ir à ainda mais populosa Calcutá onde, no dia 20 de Maio de 1498, terá chegado Vasco da Gama. O explorador cumpria assim o sonho de D. João II: o de descobrir o caminho marítimo para a Índia. Ainda que o rei português já não fosse vivo para celebrar a descoberta.

As incursões dos portugueses pela Índia, ao longo da História, não se ficaram por aí. Goa é um exemplo de como Portugal terá expandido o seu império à escala global. Invasão atrás de invasão, soberania sobre soberania. É difícil aceitar de braços cruzados a necessidade que certos homens sentem em dominar, controlar, subjugar tantos outros homens.

Recorro novamente à 'nossa' História para ilustrar, de forma pouco colorida, aquele que é, a meu ver, o início de uma das épocas mais negras da vida portuguesa: o estabelecimento da 'santa'(???) inquisição em Portugal. A 23 de Maio de 1536 começava oficialmente a perseguição aos 'hereges'. Mais um pretexto, creio, para alguns aumentarem o seu poder sobre muitos outros.

Corro o risco. Mas pergunto: em nome de deus? qual deus? o do cristianismo? o do islão? o do judaísmo? ou em nome dos milhares do hinduísmo? o do sikhismo ou o do janaísmo? ou em nome das pessoas que terão dado origem ao budismo, confucionismo ou taoísmo?
Serve esta enumeração para realçar a pluralidade e a diversidade, sem com isso pretender fazer sobressair ou apagar qualquer crença religiosa.

Templo Sique, Amritsar


Na génese de (quase) todas está a necessidade humana de dotar sentido à existência. Ao mesmo tempo, podemos entrever em todas elas uma base compassiva, cujos princípios são, afinal, semelhantes e coincidentes entre si na sua essência: os do amor compassivo e incondicional.

O amor infinito que a Natureza nos demonstra a cada instante, providenciando de forma amorosa e incondicional o necessário para todos os seres vivos. Estejam eles atentos. Todavia, quando um homem se põe a pensar, transforma e quantas vezes adultera aquela ideia básica de compaixão. E, sem que se dê conta, surge aqui e ali uma luta de deuses (humanos) pelo poder... em nome de outros deuses. Ah... Como pode ser triste a vitória do deus do islão sobre o deus cristão e vice-versa.

Tristezas, angústias e pessimismo à parte, em alguns países é possível observar a co-existência de diferentes crenças religiosas. O Nepal e a Índia são disso exemplo. A entrada em algumas cidades nepalesas suscita, até, certas dúvidas. É no Nepal que encontramos o hinduísmo como religião oficial, mesmo que em Lumbini existam centenas de templos dedicados a Buda. Não fosse esta a cidade-berço de Siddhartha Gautama Buda. Aqui, os templos construídos e doados por muitos países asiáticos, como a Coreia do Sul, Myanmar, Camboja, Índia, concorrem entre si, em termos de grandiosidade, e com os pequenos templos dedicados a Shiva ou a Krishna ou a outros deuses hindus.
Lumbini, Cidade berço de Buda

Esta convivência cultural estende-se aos níveis mais prosaicos da vida quotidiana. 

Ao ponto de por vezes me perguntar se estou no Nepal ou na Índia. As vestes coloridas das mulheres, os cabelos pintados de quase todas as pessoas com cabelos brancos quantas vezes ficando de cor alaranjada, pela fraca qualidade da tinta , a música, os filmes de Bollywood, a mescla culinária entre o dal bath nepalês e o curry indiano, alguns hábitos como o de mascar paan (uma semente a que se junta nicotina e outras forma de tabaco, enrolado em folhas da árvore bétele) são facilmente visíveis em Chitwan a cidade que dá acesso ao Parque Nacional com o mesmo nome.

No 'parque protegido', (ainda) se podem observar muitos animais selvagens, como o rinoceronte, veados, crocodilos ou elefantes. Quanto a estes, a maioria já não é assim tão selvagem, e o uso e abuso a que estão sujeitos para satisfazer os caprichos turísticos, sugerem muitas outras questões...



Mas as semelhanças entre os dois países, pelo menos nas proximidades fronteiriças, são de tal modo visíveis que se pode perguntar se as guerras a que assistimos fazem sentido... Sobretudo num tempo em que a globalização promove o intercâmbio de culturas, tornando ainda mais difícil encontrar diferenças de substância. Daí que me questione cada vez mais acerca da necessidade de manter as fronteiras territoriais, geopolíticas... Claro que este assunto é sensível, mas fica uma semente para reflectirmos acerca do que queremos para as gerações vindouras...

Ironicamente, a data de 23 de Maio serve para evocar a proclamação da independência a Portugal, em 1179, concedida pelo Papa Alexandre III, através da bula "Manifestis Probatum".

Também nesta data, mas já em 1977, nascia uma pessoa muito especial, por isso, sinto-me compelida a abusar deste espaço para desejar feliz aniversário ao meu querido irmão...

Para terminar e tentando fazê-lo com mais cor, o mês de Maio é, a meu ver, um mês muito propício à contemplação em todo o território 'português'. De norte a sul, as flores oferecem-se aos insectos que espalham, voando, ainda mais cor e possibilidade para germinar muitas outras vidas. Uma celebração constante, iluminada e pintada pelas vozes das aves que cantam, em modo contínuo, para quem quiser escutar.

Depende, pois, de cada um de nós reconhecer e receber a generosidade infinita da Natureza. E depende, sem dúvida de nós, humanos, estar atentos e conscientes para A proteger e preservar. Se quisermos proteger e preservar a vida... Humana. E que seja uma vida mais humana...



*Este texto foi publicado no Jornal Chapinheiro

Avicii - uma estrada (in)terminável *



https://youtu.be/IcrbM1l_BoI


A estrada é interminável.
O vento acorda o poeta.
Posso ser o sol do teu coração. Mas sou imparável.
Desperto todos os dias contigo.
Os braços estão quase abertos com a cor do teu amor, sem gravidade.
Podemos ser tudo. Os olhos não são suficientes para agarrar a estrada.
Acorda-me. Mesmo que não tenhas planos. O que posso eu fazer? Estou fora de controlo. Fui apanhada de surpresa.
Vamos pelo mar do teu mundo.
A magia está no sol dos teus olhos.
Sinto-me bem quando escuto a voz do teu rosto - uma estrada interminável...

21 de Abril de 2018
Nova Déli, Índia


*Avicii desapareceu esta noite. Tinha 28 anos! 

Na pele de um rinoceronte



Posso tocar? O cuidador anuiu. Não hesitei. A pele do rinoceronte bebé era muito mais dura, muito mais grossa e, ao mesmo tempo, muito mais macia do que imaginava.

O dorso cinzento da cria de nove meses era uma camada protectora forte. O relevo das marcas na pele jovem era tão suave como o seu olhar - quando se desviava dos ramos e folhas para perscrutar a sua observadora.

Saltitei, deslumbrada como se tivesse seis anos, na sua direcção logo que o avistei. A indiferença do animal selvagem surpreendeu-me. Talvez por estar entretido na sua ruminação, como se meditasse. Sentado a seu lado, um homem de cabelo preto recentemente pintado, com olhos rasgados no seu rosto tisnado pelo sol nepalês: o seu cuidador. Informou-me quase no final do encontro. Ah... Até aí ignorava a razão da sua presença, tão-pouco a utilidade da cana de bambu à sua frente e menos ainda o esforço que aparentava fazer para não a usar.

Tenderi estava ferido. Caiu na casa (?), justificou o homem, sem tirar os olhos do telemóvel. Vi sangue em várias partes do corpo. Uma ferida no focinho, uma ferida numa pata, duas feridas no dorso, uma outra numa perna. O jovem animal continuava a intrigar-me. Não parecia nada de grave, mas tendo em conta que os rinocerontes órfãos ficam sob cuidado humano até aos três anos, antes de regressarem à selva - neste caso, para o parque nacional de Chitwan -, presume-se que seja para estarem protegidos dos grandes predadores e outros perigos.

Foi Raj Indra, o guia do sítio onde me hospedei, que me deu a saber a origem do jovem Tenderi. Durante a conversa com o seu cuidador, se é que se pode considerar conversa (as poucas palavras que aprendi em nepalês eram insuficientes para aprofundar o assunto), não me foi possível perceber que o rinoceronte bebé era órfão. Na verdade, a proximidade que me permitiu tocá-lo, sentir a sua pele, escutá-lo e observar a sua boca ruminante, emocionou-me ao ponto de ficar confusa quanto à causa das lágrimas que tentei reprimir. Os olhos húmidos resultavam da alegria da minha criança e da tristeza pelo eventual (?) sofrimento da 'criança' rinoceronte.

O guia atenuou parte da angústia causada por aquele encontro. Pelo menos existem alguns cuidados em relação às crias que perdem os seus progenitores. Pelo que percebi, esta é uma forma de os proteger de grandes predadores, como o leopardo, uma das espécies que vivem naquela área protegida.

Na manhã seguinte, durante o passeio ao amanhecer: outro bebé, outro toque, outra emoção, mais angústias. Um elefante bebé. Outro cuidador que o trazia a passear, como se de um animal de estimação se tratasse. Também senti a pele desta cria, cuja reacção me fez novamente transbordar. O som que emitia era uma novidade, uma espécie de guincho, dando-me a sensação de que estaria a gostar e queria mais (ou talvez fosse o que a minha criança queria acreditar).

Mas o seu cuidador estava com pressa e tive de me contentar em passar a mão por um minuto. E que minuto... Os pêlos negros da pele cinzenta esbatiam a sua rugosidade. Enquanto a mão se movia, tentando agarrar as sensações, para mais tarde as transpor em palavras, o cérebro processava as novidades que o tacto lhe providenciava. A memória deste sentido ficou ainda mais rica.

A minha criança deslumbrava-se.

Não obstante, a pessoa que em mim habita ficava ainda mais em cuidado. Aquele jovem elefante, como muitos outros em Chitwan e outras partes do mundo, estava a ser domesticado, a fim de ser mais um dos entretenimentos para os milhares de visitantes do Parque Nacional.

Pergunto-me se, pelo menos por algum momento, se, pelo menos um ou outro visitante se tenta colocar na pele de um rinoceronte ou de um elefante... quando se deixa passear em cima da sua pele...


15 e 18/04/2018
Chitwan, Nepal
Nova Déli, Índia

O banho dos elefantes


 O banho dos elefantes é uma das atracções de Sauraha, uma das vilas que dá acesso ao Parque Nacional de Chitwan, Nepal. São inúmeras as agências turísticas que oferecem uma série de actividades aos visitantes. Caminhadas de um ou vários dias na selva, passeios de jipe na selva ou até ao lago 20000, passeios de canoa, passeios nocturnos, a pé ou de jipe, noites na torre - presume-se que numa das muitas torres de militares, aqueles que fazem a vigilância do parque nacional -, observação de aves, passeios de elefantes e banhos dos elefantes.

Aluguei uma bicicleta e ontem pedalei até ao lago 20000, onde subi a uma das tais torres de madeira e tecto de alumínio azul. Os seus dois andares têm um impacto discreto na paisagem. O mesmo não se pode dizer das garrafas de plástico à beira-lago, tão-pouco do pó que engoli antes de me sentar num dos bancos providenciados para a contemplação.

 Entre a bilheteira e o parque de estacionamento percorri cerca de cinco quilómetros em terra batida na companhia de um militar, com quem ia trocando impressões acerca de Portugal e Nepal. O cheiro a queimado era resultado de um incêndio recente provocado por algum fumador distraído. Ali, na floresta de Chitwan. A conversa ia sendo interrompida pelo motor e o pó dos jipes, o que me obrigou a lavar o cabelo à chegada a casa.

 Contemplei os muitos verdes das águas e da vegetação em torno do lago, melhor dizendo, lagos. Os diversos leitos de água faziam adivinhar dezenas, não milhares de pequenos lagos. Um local também apreciado pelos mais jovens, a ver pelos pares amorosos que ali se encontravam a passear. Também duas famílias nepalesas desfrutavam do lugar.

 No regresso a Sauraha, cruzei-me com muitos nepaleses deslocando-se bicicleta, sendo abordada inúmeras vezes com um sorriso acompanhado de Namastê. Não era a única estrangeira, mas os poucos que escolhem a bicicleta para conhecerem as redondezas faziam de mim uma atracção local. Os óculos de lentes azuladas e espelhadas também cativavam as crianças sorridentes e curiosas.

 Nas proximidades da vila ultrapassei vários elefantes transportando algumas pessoas no seu dorso. Tão altivas que não tinham como vislumbrar, só assim entendo a sua opção, o olhar tão pesado, quanto triste dos animais. A sensação que tive foi a de que a sua angústia era proporcional ao seu tamanho. Mas o olhar dos turistas não terá captado o rio perdido dos seus transportadores.

 Quando, hoje, me dirigia para o lugar onde os elefantes vão a banhos, não sabia o que ia ver. No dia em que cheguei, Raj Indra, um dos funcionários e guia do hostel, conduziu-me por um curto passeio pelas redondezas, assinalando-me à distância este local, informando-me a hora estipulada para o efeito: onze da manhã.

Passava-me pela cabeça que seriam às dezenas, os maiores mamíferos terrestres no rio, dado o número de locais que oferecem os seus serviços. Durante o caminho observava uma espécie de discurso interior, como que a preparar-me psicologicamente: muito bem, pelo menos levam os pobres animais ao rio; talvez assim se sintam um pouco livres dos seus deveres.
 Qual quê!

Ainda era cedo, dez e pouco, quando alcancei a margem do rio e vi três elefantes. Imagino que o número tenha subido ao longo da manhã. Em cima de cada um deles, estavam outros animais, os humanos. Nem ali os trombudos estavam em paz. Pelo contrário, eram estimulados - espicaçados, melhor dizendo, com um pau - para molharem os humanos com as suas trombas, à laia de mangueira.



 Os grandes paquidermes tinham a pele manchada, parecia gasta e doente. Perguntava-me se as escovas seriam adequadas para aquela pele sem a sua camada de lama protectora face aos raios solares. Acredito que em Chitwan essa protecção seja necessária, uma vez que a cor avermelhada do sol, aquando das suas fases nascente e poente, confirma os elevados níveis de poluição.

 Sentei-me debaixo da palhota com cerca de dois metros de largura e cinco de cumprimento. Insuficiente para a plateia que chegara com antecedência.

Ao meu lado, uma jovem turista perguntava ao seu guia se este iria ao banho, com um dos elefantes. Ele respondeu com a mesma questão. A jovem loira de olhos azuis parecia na dúvida. Talvez estivesse céptica quanto à qualidade das águas. O fraco caudal - estamos em meados de Abril - aguarda o início da monção para recuperar deste clima mais quente e seco. O verde acastanhado era pouco convidativo, pelo menos para esta estrangeira. Mas à beira rio adivinhava-se uma fila de gente a querer saltar para as costas dos elefantes e assim levar com a sua tromba... de água. Escutava a conversa de ambos com curiosidade e até expectativa. O guia dizia à moça que podia tomar banho quando lhe apetecesse, enquanto que ela teria ali a sua oportunidade... única.

Engoli em seco as palavras que voaram numa voz doce e num inglês não nativo, tentando captar traços de ironia: "eu gostava de te ver a tomar banho com o elefante". Sim senhora, um dois em um. O maior animal terrestre, aqui domesticado (na melhor das hipóteses), subjugado aos caprichos dos turistas e a dar banho ao guia local. Uma bela fotografia para postar nas redes sociais.

Não consegui esperar pelo ponto alto do espectáculo circense. Ainda que não tenha poder para evitar este tipo de prática, o facto de estar aqui implica-me o suficiente para, pelo menos, partilhar este texto, ao mesmo tempo que reflicto acerca dos meus próprios comportamentos e atitudes, questionando-me: como posso eu contribuir para um mundo um pouco mais justo, um pouco mais
amoroso e mais sustentável?...


12/04/2018
Chitwan, Nepal




Vislumbres do Nepal *



Sentada à beira do lago de Pokhara. Parapentes coloridos pintam o céu azul sobre as mais altas montanhas do planeta. A brisa permite que esvoacem com facilidade, distraindo os dedos do teclado, ao mesmo tempo que lembram o privilégio de estar a cumprir o sonho de tocar, cheirar, escutar os Himalaias.

Pokhara é uma cidade muito turística, com gente de todo o mundo, dado ser um dos pontos de partida para as longas caminhadas pela cordilheira mais alta do mundo. Os primeiros vislumbres do Annapurna, um dos picos com mais de oito mil metros, justificam o desconforto sentido durante as viagens de autocarro, desde Varanasi, na Índia, até Katmandu e, da capital do Nepal até à cidade lago, Pokhara. De facto, as estradas em obras, percorridas em autocarros rústicos, demonstraram ser duras provas de resistência. Ninguém disse que seria fácil...

Todavia, quando se recupera o motivo pelo qual as estradas se encontram ainda num estado deplorável, aquele desconforto é despiciendo. O sismo ocorrido a 25 de Abril de 2015, com a magnitude de 7,8 na escola de Richter, resultou em milhares de vítimas e na destruição de outras milhares de infraestruturas, entre as quais a Praça Darbar, em Katmandu património da humanidade.

Na capital e arredores, as consequências são ainda muito visíveis, quer pelas obras de recuperação, quer pela dificuldade em transitar pelas estradas. O indizível sofrimento que o povo nepalês terá vivido, e certamente ainda sentirá, não destruiu a generosidade, tão-pouco apagou o sorriso das gentes dos Himalaias.

Os dias de voluntariado, num 'ashram' de meditação, permitiram desfrutar dessa bondade, bem como captar alguns vislumbres de costumes e hábitos da cultura do Nepal.

Namastê! A divindade que em mim habita, reconhece a divindade que em ti se manifesta. Namastê! A primeira palavra proferida, acompanhada de um gesto de reverência e respeito, por todos os que se encontram pela primeira vez em cada novo dia. A uma desconhecida e estrangeira, esse gesto era iluminado por um sorriso aberto, como que indagando se estaria bem, ou se precisaria de alguma coisa para ficar melhor.

O almoço era sempre uma experiência incógnita. A cada dia um novo prato, mais ou menos picante, mas sempre saboroso. As 'chapatis' acompanhavam os legumes e leguminosas cozinhados com uma diversidade imensa. Sozinha na minha refeição, dava por mim a sorrir na primeira colherada a tocar as glândulas gustativas. Sim, colher, sobretudo para as pessoas estrangeiras. A grande maioria das nepalesas, como as indianas, dispensam os talheres.
Se me reporto apenas às mulheres, deve-se ao facto de, naquele espaço de meditação, a segregação entre os sexos ser obrigatória. Se noutros retiros isso acontecia somente entre os estudantes de vipassana, ali, essa separação mantinha-se igualmente entre os servidores e voluntários. A vigilância mantinha-se ainda durante as refeições, sendo que havia uma sala de jantar para as mulheres e outra para os homens. Quanto às servidoras e voluntárias, sugeria-se que se recolhessem numa arrecadação na última refeição do dia.

Por vezes, também era chamada a almoçar na arrecadação. Mas o objectivo era outro: uma das servidoras mais velhas fazia questão de me providenciar novos paladares. Na última refeição tive direito a cinco 'mo-mo', um dos pratos típicos do Nepal. Uns rolinhos de massa (crua, pareceu-me) recheados de legumes acompanhados de um molho mais ou menos picante. Delicioso!

À semelhança de outras paragens e culturas, também aqui as vestes das mulheres procuram manter o recato, protegendo todo o corpo, com excepção das extremidades, não apenas do sol, mas sobretudo do olhar alheio. No Nepal, as mulheres hindus, tal como as suas congéneres indianas, usam calças e saris de todas as cores. Percebe-se alguma predominância do verde e do cor-de-rosa. Já as muçulmanas, como em quase todos os lugares, cobrem a cabeça e muitas o rosto, conferindo, com frequência, mistério ao seu olhar impenetrável.

Não era o caso de Sudharta, a minha companheira de serviço. Sempre pronta a ajudar-me em todas as tarefas e respectiva compreensão, a tez morena de Sudharta revelava uma vida inteira na sua expressão. O olhar negro e profundo vagueava entre as memórias das dificuldades já vividas e a alegria de servir e ser útil.

A minha companheira de voluntariado vive há cinco anos na Dinamarca, com a sua família. Foi o marido que a escolheu para dela desposar, quando a jovem tinha 18 anos. Apesar do amor que Sudharta desde o início sentiu pelo homem que a seleccionou, a sua família ainda hoje discorda do seu casamento. Também foi o marido que decidiu a nova morada, com a esperança que o filho, hoje com 17 anos, tivesse mais oportunidades de educação e futuro profissional.

A experiência num país do norte da Europa mostrou a Sudharta outras formas de vida, outros hábitos e outros costumes. Era com algum descontentamento que Sudharta se referia e comparava algumas práticas do seu povo, em particular aquelas relacionadas com o tratamento do lixo, ou a ausência de tratamento e cuidado.



É curioso como as perspectivas transformam o olhar. As semanas anteriores, passadas no norte da Índia, amenizaram aquelas palavras em tom de crítica da minha companheira. Depois de me ter emocionado com a pobreza, aliada à falta de higiene (segundo os meus padrões) na Índia, os meus olhos observavam e observam, no Nepal, pessoas continuamente a limpar o chão, tornando as ruas transitáveis sem a preocupação constante de estar atenta por onde colocar os pés. Desse modo, podia, posso, contemplar tranquilamente as cores das flores, dos pássaros, das borboletas.

Ah, e tantas borboletas serpenteiam à minha volta. Brancas e pintalgadas, amarelas e riscadas. Ainda nenhuma azul... Quem sabe vislumbre outras tantas borboletas aquando do circuito do Annapurna que iniciarei dentro de dois dias.

Namastê!


*Este texto foi publicado no jornal Chapinheiro