Parque Tayrona com Carol





            Um lugar fundamental e imperdível. Tayrona. As fotografias de um amigo viajante. Uma inspiração que me guia. Tayrona. O Parque Nacional Natural, próximo da cidade Santa Marta na costa do Caribe. Carol - Niña para o seu amado sobrinho; outra tia babada - vive numa quinta de permacultura nas imediações de Santa Marta.

            À saída de Bogotá, uma mensagem através do FB - digam o que disserem, tem sido um excelente modo para contactar amigos, familiares e conhecidos. A reacção de Carol foi surpreendente - desejava acompanhar-me para uma caminhada no parque!

            Conheci a Carol o ano passado num mosteiro de Choachí, a uma hora de Bogotá. Servimos juntas durante onze dias num retiro de meditação Vipassana. Antes dela, encontrei-me com outras amigas em Bogotá que também se instalaram confortavelmente no meu coração, nesses dias de pouco silêncio para os servidores da Vipassana.

            Dois dias depois de ter aterrado em Santa Marta apanhei o autocarro para o parque. E não é que a meio do caminho a Carol entrou?! Que agradável coincidência. Ofereci a entrada no parque. Para as pessoas da Colômbia o valor é um terço do preço para os estrangeiros. Pareceu-me ser o mínimo a fazer, dada a sua pronta disponibilidade. Relutante, aceitou. Sorrindo, agradecia. As restantes despesas foram naturalmente partilhadas, sendo certo que foi ela quem mais ofereceu. A generosidade das pessoas que se têm cruzado comigo tem sido transbordante. Também eu transbordo de alegria e felicidade com o que vou experienciando.

            Como a primeira praia onde começámos a nossa caminhada. Cañaveral. Extasiada. Assim comecei, assim permaneci até ao fim dos três dias. O calor abrasador convidava ao primeiro banho de mar. A minha estreia na Colômbia. Nessa praia apenas os pés e as pernas. As ondas revoltas inspiravam muita precaução. Sentei-me a contemplar os pelicanos. Outra estreia. A praia deserta de água tépida aqueceu ainda mais o meu coração.

            Seguimos para outra praia, desta vez a trote. A mochila pesada com os alguns haveres e o garrafão de cinco litros de água impeliram-me a aceitar a sugestão da Carol. Apesar do caminho lindo, muito verde e musical não me senti particularmente bem. O calor que naturalmente também afectava os cavalos, que transportando-nos a troco de dinheiro para os seus 'proprietários', provocou-me um certo mal-estar.

            É pouco provável que repita este tipo de experiência. Deixámos os cavalos à entrada de um parque de alojamento com acesso à Praia Arrecifes. Aí nos deleitámos em contemplação meditativa. O coração de Carol espalha sabedoria. Transmitia uma paz imensa, como imenso era o mar com horizonte longínquo. Tão pequena e tão enorme me sentia. O meu ser recebia a totalidade em cada instante.

            Foi somente na terceira praia - La Piscina - que nos despimos para o banho. Merendámos e desfrutámos da água tépida. O meu corpo multicolor. Peito e braços bronzeados, tronco e coxas a roçar a roupa branca em lixívia e pernas menos mal... Uma caricatura hilariante registada em fotografia.

            Serena e grata - o estado em que essa água salgada, límpida e morna me concedia. Éramos. Assim... tão simples ser feliz. Ser, no mar em companhia de uma pessoa tão bonita como a Carol. As marias-mulatas - pássaros negros semelhantes aos melros - eram a companhia sonora. Ofereciam uma melodia harmoniosa juntamente com o leve ondear da água na areia branca e macia.

            O sentimento de gratidão cresce em cada dia desde que aterrei na Colômbia.

            A partir das cinco da tarde não é permitido caminhar pelos 'senderos' do parque Tayrona. Atracámos então no Cabo San Juan del Guia. As hamacas - espécie de redes mas mais robustas - estavam todas ocupadas. A Carol ofereceu a noite numa tenda. Amarela, a única sem número e de cor distinta das restantes - num verde desbotado pelo sol. A nossa tenda, plantada na primeira linha: o mar tranquilo à nossa frente.

            Chegámos pois a tempo de assistir ao pôr-do-sol. Perfeito. Sentadas à beira-mar, partilhando experiências. Eu bebia a sua sabedoria, confirmando novamente como privilegiada sou. Seguiu-se um jantar simples no restaurante do parque. Peixe fresco para a Carol, vegetariano para mim. Tenho encontrado sempre uma alternativa. Escandaloso, o céu exibia as Ursas,  Cassandra e outras  constelações. Que mais desejar?

            Às cinco da manhã seguinte estávamos as duas, cada uma em seu espaço, aproveitando o silêncio matinal para a meditação do mar. O pequeno-almoço foi preparado por mim e servido num banco rústico em frente ao mar - o peso do dia anterior ia diminuindo. Valeu a pena o esforço pelo bem que soube a partilha no lugar perfeito.

            A suite ficou trancada com as mochilas e partimos pelo trilho até ao Pueblito Chairama. Em teoria, seria uma hora e meio de caminho subindo até à povoação indígena protegida. Não sei se era pela minha companhia; o inevitável aconteceu. Perdemo-nos! Escapou-nos uma das placas informativas. Subimos fora do trilho e ficámos estancadas no meio da vegetação cerrada. Descansámos para decidir como prosseguir. A prática mística de Carol sugeria que voltássemos atrás, antes que nos embrenhássemos ainda mais na floresta semi-tropical. Uma ideia sensata que nos conduziu finalmente ao Pueblito Chairama.

            Em vez de hora e meia, demorámos quase quatro. Na bolsa, as duas barritas de cereais foram a merenda possível. A comunidade indígena, constituída por vinte pessoas oferecia apenas, e tanto!, bebidas frescas. O preço era o previsível pelo difícil acesso. Passeámos e desfrutámos do silêncio entremeado pelos passos tranquilos dos habitantes remotos que ainda sobrevivem e vivem ao ritmo da Natureza.

            Os cabelos longos e negros, as vestes da cor de pérola decoradas com colares por si elaborados, o regozijo para os nossos olhos bem abertos. E para as fotografias, também. Estas foram pagas. Manoel, um dos indígenas com quem conversei manifestou insatisfação para com o governo e para com muitos turistas. As minhas palavras - segundo Manoel - eram diferentes. Aceitara com naturalidade a sua recusa em deixar-se fotografar. Ofereci-lhe uma gratificação. Gostava de guardar uma recordação bonita do lugar, ao mesmo tempo que ajudava um pouco a população esquecida. Acedeu. Eu sorri e guardei, também para partilhar com quem quiser.

            Eram três da tarde quando chegámos ao Cabo. A intenção inicial era fazer o check-out até ao meio-dia. Ah, ah! Almoçámos em companhia de uma mulher de Bogotá. A Esperança. Havíamos conversado com a senhora e os seus filhos no caminho para o Pueblito. Na realidade, essa foi a distração que promoveu a demora - uma forma ligeira de dizer que nos perdemos.

            A senhora Esperança e os dois filhos - jovens adultos - não alçaram o lugar mágico. A sua segunda tentativa frustrada. As pedras não lhes abriram o caminho, justificou resignada. A tarde continuou em languidez à beira-mar.

            Na tenda, às sete da noite, com as cabeças viradas para a 'porta', apreciámos mais uma vez o céu semeado de estrelas. Adormecemos até às seis da manhã seguinte. O corpo pedia. Escutámos a sua sapiência natural.

            A última manhã foi percorrendo o caminho de volta pelo interior do parque seguindo o ritmo musical das aves, das árvores, do vento nas folhagens altas.

            Despedi-me com até logo, num longo e forte abraço no autocarro de volta para Santa Marta. A Carol vive numa quinta que aceita voluntários. Cinco horas diárias de trabalho no campo em troca de alojamento e alimentação - muito atractivo. Quem sabe em Junho...

            Querida Carol, muito obrigada pela partilha e por estes dias tão lindos no Parque Nacional Natural de Tayrona. Estão em mim, com certeza para sempre. Estou cheia, transbordando!

 

 
 
25 de Maio, 2015

Bucaramanga, Colômbia 


 

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