A primeira vez que me perdi






A primeira vez que me perdi... Não é fácil resgatar esse momento, tão-somente esse é o estado que me caracteriza desde pelo menos os dezassete anos. “Quando foi que me perdi?” – a questão que me coloquei há pouco tempo e a L respondeu com uma fotografia. As duas em fato-de-banho na piscina do Castêlo. Eu de indumentária de nadadora-salvadora... dos outros.
Nesse ano entrei para a faculdade para nunca mais encontrar aquela garota de vermelho jovial e resplandecente, qual baywatch das séries televisivas.
Em termos concretos sou completamente desorientada. Uma das razões que me leva a sair de casa com antecedência para os encontros em locais que desconheço. Horas a fio em busca do evidente: bastaria saber ler um mapa.
Ninguém acredita quando digo que tenho troféus das provas de BTT-Orientação. É verdade! São duas ou três taças em segundo e terceiro lugares. Em 2000 éramos muito poucas, as mulheres, a sair de bicicleta-todo-o-terreno com um mapa a orientar o percurso. Adivinha-se facilmente que terei conseguido as taças por sermos apenas duas ou três concorrentes vestidas de calções almofadados e capacete. A feminilidade estava de todo escamoteada.
Que importa isso face à sensação de solidão desesperada no meio do monte? Um trilho de terra batida ladeado por campos de cultivo de milho de um lado e um pinhal do outro. O cruzamento sob a chuva fria e eu sem perceber o Norte no mapa e muito menos pela localização do sol – ofuscado pelo cinzento carregado: “Oh meu deus! Mas porque é que não fiquei no sofá a ver a televisão?”
As encruzilhadas são manifestamente bons testes, neste caso à resiliência de quem se sabe perdida por natureza. Virava-me para um lado... a bússola? Acho que não funcionava... para mim nada disso é útil. Pedalei insegura pelo lado esquerdo, talvez – seguindo esse trilho do coração. Ao fim de quatro horas chegava à meta. Apenas os juízes da prova. Estavam à minha espera para fechar o estaminé...
Os episódios e as dificuldades em encontrar o destino são tão frequentes que por vezes fico na dúvida quanto à significância dessa metáfora na minha vida.
Perder-me tem, no entanto, vantagens. Antes de alcançar o lugar final percorro novos espaços, ruas diferentes, que me tocam de modos distintos. Também se atravessam pessoas antes desconhecidas.
Em suma: estar perdida obriga-me a procurar e sobretudo a despertar para o momento, local e pessoa que entram em mim. Bem-haja o mapa que me (des)orienta!

1 comentário:

  1. Muitas vezes é preciso perderme-nos para nós encontrarme-nos, mas fugindo do sofrimento também não iremos encontrar a felicidade. Em algum momento da nossa vida temos de romper com as barreiras que nós impedem de evoluirmos e nada melhor que partirmos percorrendo o caminho do desconhecido, por estas razões estou solidario com a tua desorientação e obrigado por perceber que não sou o unico.

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